No
cinema, teatro ou televisão, ele sabia improvisar. Dono de uma consagrada
expressão facial e corporal, seus personagens tinham apelo popular. GRANDE
OTELO (1915 - 1993) foi o primeiro artista negro a ocupar espaço de destaque no
cinema e na televisão brasileira. Desde a infância vivida em Uberlândia, Minas
Gerais, ele tinha atração pelas manifestações
populares, como o carnaval e as congadas. A comédia “O Garoto / The Kid” (1921),
de Charles Chaplin, apareceu como uma influência decisiva no seu encantamento
pela carreira artística. Considerado um menino prodígio, manifestou sua
primeira experiência como ator aos sete anos, fazendo uma participação no circo
que passava pela sua cidade natal. Na ocasião, Bastiãozinho, como era
conhecido, apareceu vestido de mulher interpretando a esposa do palhaço, o que
causou enorme comicidade.
Desde
muito pequeno, em troca de moedas, cantava e dançava para hóspedes de um hotel.
Com o passar do tempo, trocou de família diversas vezes, foi morador de rua e
do Abrigo de Menores. Movido por uma extraordinária vocação artística,
chegou ao Rio de Janeiro, de onde sua fama se espalharia pelo resto do país,
brilhando na atmosfera exuberante do Cassino da Urca, com espetáculos
mundialmente famosos; nas hilariantes chanchadas da Atlântida; no Cinema Novo e
nas telenovelas da Globo. O teatro, sua primeira paixão, não deixaria de contar
com suas marcantes interpretações. Entre 1946 e até o final de sua carreira, o artista participou de inúmeras peças. Entre elas, “O Homem de La Mancha” (1973), ao lado de Bibi Ferreira e Paulo Autran, e
“Vivaldino, Criado de Dois Patrões (Arlequim)” (1976), com Ary Fontoura e Ítala Nandi. De uma vida intensa e
controvertida, muitas vezes tatuada pelos preconceitos, viveu sempre na fronteira entre o profissionalismo e a boêmia -
e fez de seu talento uma estratégia de sobrevivência. Mas a tragédia muitas
vezes se fez presente na vida real.
Ele
nunca conheceu o pai, que morreu esfaqueado em circunstância misteriosa. Quanto
completou oito anos de idade, conseguiu um pequeno papel dentro do espetáculo de
uma companhia de teatro mambembe que passava por sua cidade. Ao ver a
habilidade do garoto diante da plateia, a diretora do grupo, Abigail Parecis,
convenceu sua mãe a deixar o filho trabalhar em São
Paulo como artista. Devido à sua voz de tenorino, um professor de canto julgou que um dia o menino
cresceria e cantaria a ópera "Otelo", de Giuseppe Verdi. Então, pela estatura pequena (media 1,50 m.), foi apelidado de Pequeno Otelo. Insatisfeito, ele fugiu e
passou um período nas ruas e outro sob a tutela do Juizado de Menores. Depois,
foi adotado pela família de Antônio de Queiroz, um político influente.
Ele o ajudou a se
incorporar aos 10 anos de idade na trupe da Companhia Negra de Revistas, regida por Pixinguinha, apresentando-se em Santos, Minas Gerais, Rio de
Janeiro e Bahia. Em 1935, passou a atuar na Companhia Tro-lo-ló, de Jardel
Jércolis, pai do ator Jardel Filho, e um dos pioneiros do teatro de revista.
Ainda
nesse mesmo ano, já como GRANDE OTELO, estreou no cinema em “Noites Cariocas”, dirigido pelo argentino Enrique Cadícamo para a produtora Cinédia. Curiosamente se cruzaria pela primeira vez com Oscarito nesse filme e mais
tarde os dois se tornariam uma das duplas cômicas mais famosas e engraçadas do
cinema brasileiro. Rio de Janeiro, a cidade maravilhosa, logo seria adotada como
sua cidade. Apreciador da sua vida noturna, foi também um de seus atores,
seja na famosa gafieira do Elite, no bar Vermelhinho ou nos bares da Lapa.
No Rio dormiu em bancos de praça, hospedaria de mil-réis e até em pensão de corda (estabelecimento perto da Central do Brasil). Por sorte, o produtor norte-americano Wallace Dolney, que o conhecia das filmagens de “Noites Cariocas”, o convidou para atuar em “João Ninguém” (1936), com roteiro de João de Barros e direção de Mesquitinha. No mesmo ano, passou a trabalhar no famoso Cassino da Urca, e lá se ficou até o seu fechamento em 1946, nele brilhando com Carmen Miranda e realizando diferentes espetáculos. Mesmo assim, era alvo de discriminação, recebendo salário menor que atores brancos de mesmo destaque e era a única estrela proibida de entrar pela porta de entrada.
No Rio dormiu em bancos de praça, hospedaria de mil-réis e até em pensão de corda (estabelecimento perto da Central do Brasil). Por sorte, o produtor norte-americano Wallace Dolney, que o conhecia das filmagens de “Noites Cariocas”, o convidou para atuar em “João Ninguém” (1936), com roteiro de João de Barros e direção de Mesquitinha. No mesmo ano, passou a trabalhar no famoso Cassino da Urca, e lá se ficou até o seu fechamento em 1946, nele brilhando com Carmen Miranda e realizando diferentes espetáculos. Mesmo assim, era alvo de discriminação, recebendo salário menor que atores brancos de mesmo destaque e era a única estrela proibida de entrar pela porta de entrada.
No
Cassino da Urca, em 1939, ele contracenou com a famosa cantora e dançarina
norte-americana Joséphine Baker, momento citado por ele como um dos mais
importantes de sua carreira. Ao longo desta mesma temporada, compôs, em
parceria com o amigo Herivelto Martins, o famoso samba “Praça Onze”, que faria muito sucesso no carnaval de 1942. No mesmo ano, o cineasta Orson Welles
(famoso por dirigir “Cidadão Kane
/ Citizen Kane”, 1941) veio ao Brasil rodar o longa-metragem “It´s All
True”, conhecendo GRANDE OTELO no Cassino da Urca. Contratou o ator, mas o filme ficou inacabado e diversas cenas filmadas foram destruídas
posteriormente.
Nos
anos 1940 e 1950, trabalhou em diversos programas de rádio e compôs uma
variedade de sambas em parcerias com outros compositores. No cinema, foi uma
das estrelas da Atlântida Cinematográfica, tendo protagonizado o
primeiro sucesso da produtora, “Moleque Tião”. Também na Atlântida,
formou, ao lado de Oscarito, a dupla mais famosa e bem sucedida do cinema
brasileiro, que estrelou campeões de bilheteria como “Este Mundo é Um Pandeiro” (1946) de
Watson Macedo, “Três Vagabundos” (1952) de José Carlos Burle, e “Matar ou
Correr”. Ao longo de sua carreira, GRANDE OTELO participou de 118 filmes, 17
filmes deles com Oscarito, embora não fossem amigos na vida real. Em 1949, estrelou “Também Somos Irmãos”, ao lado de
Ruth de Souza. O filme denunciou o racismo existente no Brasil e foi
considerado o melhor filme nacional do ano pela crítica especializada.
Em um
momento de “Carnaval no Fogo” (1949), um Romeu bem pouco galante aparece em
cena para pedir a presença de sua amada na sacada. Quando ela aparece, é GRANDE
OTELO de peruca loura. O que se segue é uma das mais engraçadas cenas do cinema
nacional. Nem parece que o ator tinha passado pela pior tragédia de sua vida:
dois dias antes, sua mulher havia envenenado o filho de 6 anos e, em seguida, cometido suicídio com um tiro na cabeça. Lúcia Maria, a esposa, com quem ele era casado desde 1941,
culpou em bilhete as bebedeiras e o ciúme do ator. Em 1954, ele se casou com
Olga Vasconcelos de Souza, com quem teve quatro filhos. Ela morreu em 1983,
devido a um acidente doméstico. Após deixar a Atlântida em 1955, o ator participaria
de inúmeros filmes, com destaque para o clássico “Rio, Zona Norte”, considerado a obra que inaugurou o Cinema Novo. Na mesma década, passou a atuar na
televisão em emissoras como a TV Tupi do Rio e Tv Rio.
Um resumo do cinema brasileiro e do próprio Brasil em um de nossos maiores artistas, GRANDE OTELO também fez sucesso formando dupla com o cômico paulista Ankito e com Vera Regina. Passou alguns anos sem muito destaque. Por volta de 1965, começou a participar de programas humorísticos na Rede Globo, iniciando com “Bairro Feliz”. Em 1969, protagonizou com Paulo José e Dina Sfat, “Macunaíma”, baseado no livro de mesmo nome de Mário de Andrade, e onde interpreta o personagem título, um herói tipicamente brasileiro, ganhando prêmios importantes. Depois do filme, o ator voltou a ser manchete.
Nos
anos 1970 participou de diversos longas. Na TV, atuou em telenovelas badaladas como “Bandeira 2”, “Uma Rosa com Amor”, “Shazan Xerife
e Cia”, “Bravo”, “Maria, Maria” e “Feijão Maravilha”. Nessa mesma época passou
a ter um romance com a atriz Joséphine Hélène e após dez anos de uma
relação tumultuada, resolveram selar a união em 1984. Três anos mais tarde, o
casal foi parar nas páginas policiais dos jornais, quando numa discussão,
Joséphine acabou dando um golpe de faca na barriga do ator. Na década de 1980,
continuou sua participação em telenovelas - “Água Viva”, “A Gata Comeu”,
“Sinhá Moça”, “Mandala” e “República” -, além do programa humorístico “Chico
Anysio Show”. Rodou o internacional “Fitzcarraldo”, de Werner Herzog. Realizado na selva
peruana, GRANDE OTELO se indispôs com o protagonista, o temperamental ator
Klaus Kinski.
Em 1985,
recebeu do governo francês o título de “Commandeurs de L´Ordre des Arts e
Lettres”, que foi entregue pelo ministro da Cultura francesa, Jack Lang. Na
década seguinte, continuou fazendo
cinema e TV. Participou do filme “Boca de Ouro” (1990), de Walter Avancini,
baseado na peça teatral de Nelson Rodrigues, e em 1993 fez seu último trabalho na telenovela
global “Renascer”, interpretando Seu Francisco Galvão, pai de Ritinha (Isabel
Fillardis). Apesar de inúmeros êxitos, a carreira de GRANDE OTELO foi marcada por altos e baixos. Sua indisciplina e seu gosto pela farra noturna e pela bebida fizeram com que faltasse a ensaios e apresentações, ou fosse trabalhar de ressaca, o que gerou a fama de irresponsável. Ainda em 1993, aos 78 anos de idade, morreu na glória, de um ataque do coração,
fulminante, numa escada rolante no Aeroporto Charles de Gaule, em Paris, onde seria homenageado no Festival
de Cinema dos Três Continentes, em Nantes. Ano passado, em comemoração ao centenário do ator e a sua importância para a história da cultura nacional, a Caixa Belas Artes, em São Paulo e Rio de Janeiro, promoveu a mostra “O Maior Ator do Brasil - 100 Anos de Grande Othelo”. A exibição reuniu 23 filmes com a participação genial do notável mineiro.
FONTE
“Grande Otelo - Uma Biografia”, de Sérgio Cabral; “Uma Interpretação do Cinema Brasileiro através de Grande Otelo”, de Luis Felipe Hirano.
FILMOGRAFIA SELECIONADA de GRANDE OTELO
IT'S ALL TRUE
(1942, inacabado)
direção de Orson Welles
MOLEQUE TIÃO
(1943)
direção de José Carlos Burle
MATAR ou CORRER
(1954)
direção de Carlos Manga
RIO ZONA NORTE
(1957)
direção de Nelson Pereira dos Santos
ASSALTO ao TREM PAGADOR
(1962)
direção de Roberto Farias
MACUNAÍMA
(1969)
direção de Joaquim Pedro de Andrade
A ESTRELA SOBE
(1974)
direção de Bruno Barreto
LÚCIO FLÁVIO, o PASSAGEIRO da AGONIA
(1977)
direção de Hector Babenco
Os PASTORES da NOITE
(1979)
direção de Marcel Camus
FITZCARRALDO
(Idem, 1982)
direção de Werner Herzog
QUILOMBO
(1984)
direção de Carlos Diegues
JUBIABÁ
(1987)
direção de Nelson Pereira dos Santos
7 comentários:
Inesquecível!
Grande ator!
Inesquecível
Um dos melhores!
beleza
Bela e Justa homenagem, arrepiante!
Grande comediante
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