vivien leigh |
Em 1999, em uma chuvosa tarde de primavera, andando sem destino
pelas ruas de Londres, encontrei uma formosa praça tomada por roseiras e
árvores frondosas, a Eaton Square. Parecia outra dimensão, concentrada em um
silêncio absoluto. Em volta dela, casarões brancos e imponentes, dois ou três
degraus em cada um deles, levando a portais sofisticados. Sentei em uma escada,
abri um livro, acendi o cigarro e fiquei entre o que lia e a visão majestosa da
praça. Ao levantar-me, notei uma placa
azul entre duas grandes janelas. Curioso, li o que dizia: “Aqui viveu Vivien
Leigh, de 1960 a 1967”. Tomei um baita susto, não esperava a surpresa.
Depois do êxtase, garimpei os filmes de VIVIEN LEIGH (1913 – 1967.
Darjeeling / Índia, onde o pai trabalhava numa firma de corretagem inglesa) –
só a conhecia do popular “... E o Vento Levou” -, descobrindo uma atriz da
maior distinção. Conhecida na intimidade como Viv, com LAURENCE OLIVIER (1907 –
1989. Dorking,
Reino Unido), o Larry, formaram um dos casais mais populares da Inglaterra por
duas décadas - uma espécie de realeza do teatro. Aclamada por ser belíssima e
talentosa, a atriz esteve afetada por um distúrbio bipolar durante a maior
parte de sua vida adulta, e seu humor era quase sempre não entendido pelos
diretores.
Ainda uma intérprete iniciante, em 1935, aos 22 anos, casada, ela
conheceu seu futuro marido em um restaurante, onde ele jantava acompanhado da
primeira esposa, Jill Esmond. Apaixonou-se imediatamente, e achou que a atração
tinha sido mútua. Dois anos mais tarde, ao assisti-lo em uma peça, teve o
impulso de procurá-lo para lhe dizer que admirara sua atuação.
Durante a conversa, ele sugeriu que fizesse um teste para “Ricardo II”,
sob a direção de John Gielgud. Ela ganhou o papel e, no mesmo ano, estrelou o
filme “Fogo Sobre a Inglaterra”, na pele de Lady Cynthia, amante do espião
interpretado por Olivier. Enquanto filmavam, ficaram íntimos e a amor
surgiu.
Concluído o drama histórico, atuaram no espetáculo “Hamlet”, na
Dinamarca, no Castelo de Elseneur, local da tragédia de William Shakespeare, e
o sucesso foi retumbante. Na ocasião, os amantes perceberam que havia chegado a
hora de abrir o jogo com seus respectivos consortes. Ela escreveu uma carta ao
marido pedindo-lhe perdão e comunicando que estava com LAURENCE OLIVIER e não mais
voltaria para casa, deixando a educação de sua filha, Suzanne, por conta de sua
mãe. Transcorridos seis meses de vida em comum, solicitaram o divórcio, mas
seus cônjuges recusaram terminantemente.
No verão de 1938, quatro fitas inglesas de VIVIEN LEIGH estrearam
nos Estados Unidos, resultando em convite hollywoodiano para atuar com LAURENCE
OLIVIER na adaptação do romance de Emily Bronte, “O Morro dos Ventos Uivantes /
Wuthering Heights” (1939). No entanto, o produtor Samuel Goldwyn ofereceu a
atriz o papel secundário de Isabella (terminaria nas mãos da ótima Geraldine
Fitzgerald), cabendo a Merle Oberon o de Cathy, heroína da história romântica.
Ela não aceitou o papel coadjuvante, mas a viagem norte-americana foi
proveitosa: seria escolhida entre milhares de estrelas para viver Scarlett
O’Hara em “... E o Vento Levou”, assinando um contrato de sete anos com David
O. Selznick e levando o Oscar de Melhor Atriz.
Aos 26 anos, consagrada, decepcionou-se ao ser recusada para os
filmes “Rebecca, a Mulher Inesquecível / Rebecca” (1940) e “Orgulho e
Preconceito / Pride and Prejudice” (1940), ambos protagonizados por LAURENCE
OLIVIER. Tentou substituir Robert Taylor pelo amado em “A Ponte de Waterloo /
Waterloo Bridge” (1940), mas não deu certo. Em 1940, eles finalmente obtiveram
o divórcio e se casaram numa cerimônia íntima em Santa Bárbara, Califórnia, com
apenas duas testemunhas, Katharine Hepburn e o dramaturgo Garson Kanin. Manifestando
os primeiros sintomas de transtorno bipolar, Viv voltou aos palcos com Larry em
“Romeu e Julieta” e às telas em “Lady Hamilton, a Divina Dama” (1941).
De volta a Inglaterra, em plena Segunda Guerra Mundial, eles
divertiram os pilotos da R.A.F. em shows e retornaram aos palcos. Grávida, a
atriz ficou doente e perdeu a criança. Histérica, agrediu física e verbalmente
o marido. Com sucesso nos palcos e mergulhada em crises nervosas, seu
temperamento afetado pela doença quase sempre não era entendido pelos diretores,
e ela ganhou a reputação de ser uma estrela difícil. Diagnosticada com
tuberculose crônica na metade da década de 1940, enfraqueceu-se
consideravelmente a partir de então.
Em 1947, LAURENCE OLIVIER foi sagrado cavaleiro e o casal passou a
ser tratado como Sir e Lady Olivier. Nos anos seguintes, VIVIEN LEIGH marcou
época interpretando Blanche DuBois na ribalta e nas telas. A montagem londrina
de “Um Bonde Chamado Desejo”, de Tennessee Williams, dirigida pelo marido,
coberta de elogios, sustentava-se principalmente no seu desempenho.
Substituindo Olivia de Havilland, que recusou o papel no cinema, e contratada
pela enorme quantia de cem mil dólares, tornou-se a atriz mais bem-paga
da época. Teve um desempenho magnífico em “Uma Rua Chamada Pecado”,
sendo recompensada com um segundo Oscar e a Taça Volpi de Melhor Atriz no
Festival de Veneza. Seu triunfo teve um preço alto: “Blanche DuBois é uma
mulher da qual tudo foi arrancado, uma figura trágica e eu a entendo, mas
interpretá-la me fez mergulhar na loucura”, confessou certa vez.
Em 1951, o casal estreou no teatro “Antonio e Cleópatra”, de
Shakespeare, e “César e Cleópatra”, de Bernard Shaw, alternando as
apresentações e com imenso êxito. Dominada por colapsos nervosos, a atriz imaginava
que desconhecidos estavam tentando seduzi-la, e receava que não pudesse
resistir às suas investidas. Nesse período, sofreu dois abortos, e foi
diagnosticada como maníaco-depressiva. Gradualmente, os seus problemas de
saúde, agravados pela dependência do álcool e das drogas, interferiram na
carreira e no matrimônio. Por mais que se amassem e se admirassem, as terríveis
crises nervosas dela desestruturavam o relacionamento. Contudo, o público ainda
a amava.
Sob tratamento psiquiátrico, VIVIEN LEIGH foi convidada pelo
produtor Irving Asher para atuar com LAURENCE OLIVIER no drama “No Caminho dos
Elefantes / Elephant Walk” (1954), um triângulo amoroso em uma plantação de chá
no Ceilão. Ele não pode aceitar a oferta e foi substituído por Peter Finch. Dirigido
por William Dieterle, com Dana Andrews como o terceiro protagonista e filmagens
em locação, o filme começou a ser rodado com a estrela visivelmente cansada, à
flor da pele, esquecendo-se frequentemente do texto, à beira de recorrentes
ataques. Ela passou a seguir Finch pelos sets
com olhar de fúria, chamando-o de Larry e, à noite, alucinada, repetia os
diálogos de Blanche DuBois em “Uma Rua Chamada Pecado”, chorando
incontrolavelmente, sem pegar no sono.
Concluídas as cenas exteriores, as restantes seriam filmadas em
Hollywood. Na viagem, a atriz tentou rasgar as roupas e pular do avião. No
estúdio da Paramount repetiram-se terríveis rompantes de histeria. Ela gritava,
tal como Blanche: “Saia logo daqui, antes que eu comece a gritar fogo! Fogo!
Fogo! Fogo!”. Alguém teve a ideia de chamar o ator David Niven, amigo íntimo do
casal Olivier, e ele conseguiu acalmá-la. O produtor Asher não teve outra
alternativa senão colocar a jovem Elizabeth Taylor no seu lugar, vivendo Ruth
Wiley (nas tomadas de plano geral ainda se pode ver a silhueta de Vivien).
Felizmente VIVIEN LEIGH não concluiu o trabalho, o longa é um dos piores da
carreira de Liz. Aos 41 anos de idade, a famosa Scarlet O`Hara não aceitava o
fato de ser maníaco-depressiva e, consentida pelos médicos, fez teatro (com
casa lotada e ótimas críticas). Voltou a filmar em 1955 ao estrelar o delicado
drama “O Profundo Mar Azul”, de Anatole Litvak.
Com o ritmo excessivo de trabalho, VIVIEN LEIGH caiu em longos períodos de
depressão e passou a maior parte dos anos de 1954 e 1955 sob cuidados médicos.
No auge da anormalidade, arrancou as roupas e saiu nua pelas ruas. Em seguida,
começaram os boatos sobre a péssima situação do seu casamento. De volta aos
palcos, ela teve um caso com Peter Finch. Nos anos seguintes, continuou a ter
acessos frenéticos, muitas vezes quebrando tudo à sua volta. Em 1960, os boatos
sobre o casamento deles se confirmaram quando LAURENCE OLIVIER a abandonou para
se unir a atriz Joan Plowright, 22 anos mais nova. Ela pediu o divórcio e nunca mais se casou, continuando a trabalhar no
cinema e no teatro até sua morte súbita por tuberculose.
O romance de VIVIEN LEIGH e LAURENCE OLIVIER era considerado uma
espécie de conto de fadas para o público: famosos, ricos, talentosos e apaixonados.
Como nada é o que parece ser, uma biografia recente garante que ambos eram
infiéis desde o início do relacionamento e torturavam um ao outro com amantes
de ambos os sexos. Segundo o best-seller,
a cada crise de instabilidade emocional, a atriz procurava conforto em relações
extraconjugais, de Rex Harrison a Marlon Brando, passando por atrizes
como Isabel Jeans. Tinha predileção por jovens prostitutos e frequentava um bordel de Los Angeles especializado em garotos de
programa.
Costumava contratar desconhecidos no “Scotty’s Garage”, um posto
de gasolina conhecido por seus 22 funcionários jovens e atraentes. Ela pagava a
“cortesia de estranhos” com presentes, de cigarreiras a joias. LAURENCE OLIVIER
não deixava por menos, e teve um murmurado caso com o comediante
norte-americano Danny Kaye, entre outros. Detalhes na biografia “Damn You,
Scarlett O’Hara – The Private Lives of Vivien Leigh and Laurence Olivier”
(2011), escrita por Darwin Porter, antigo confidente da estrela, e Roy Moseley,
assistente pessoal de Olivier.
vivien, olivier e olivia de havilland |
Ela fez apenas 18 filmes. Em mais de trinta anos de teatro, VIVIEN LEIGH interpretou desde comédias de Noel Coward a dramas clássicos de Shakespeare. Aprendeu a atuar com LAURENCE OLIVIER, desabrochou com ele, mas o seu talento era nato. De beleza delicada, essa atriz de extraordinário vigor dramático é uma das maiores heroínas românticas do cinema. No seu funeral, John Gielgud disse: “Não será esquecida, porque sua qualidade mágica era incomparável. Uma grande beleza, uma estrela, uma atriz cinematográfica consumada e uma personalidade versátil e poderosa no teatro...”.
O extraordinário LAURENCE OLIVIER foi um dos mais carismáticos
atores do século XX. Sua presença em palco fascinava o público e sua
credibilidade como intérprete, no drama como na comédia, proporcionou-lhe os
maiores êxitos. Destacou-se interpretando personagens de Shakespeare, quer no
teatro, quer no cinema. Em 1978 recebeu um Oscar especial pelo conjunto de sua obra e por
sua contribuição à arte cinematográfica. Em 1970, a rainha Elizabeth II lhe
outorgou o título de Lorde, com direito a frequentar o Parlamento britânico.
Ele morreu, aos 82 anos, de câncer no estômago, dormindo em sua casa ao lado de
sua terceira mulher, a atriz Joan Plowright, com quem teve três filhos.
FOGO SOBRE a INGLATERRA
Direção de William K. Howard
Em plena guerra entre a Inglaterra e a Espanha, Vivien e Olivier
são os amantes Lady Cynthia e Michael Ingolby. Ele, um espião enviado a Madri
para descobri os nomes dos conspiradores ingleses aliados dos espanhóis.
TRÊS SEMANAS de LOUCURA
Direção de Basil Dean
Um ex-pároco (Olivier) é julgado por um crime que não cometeu.
Vivien figura como Wanda, a namorada do acusado.
LADY HAMILTON, a
DIVINA DAMA
Direção de Alexander Korda
O romance proibido entre o herói de guerra Lord Nelson e a casada Emma Hamilton.
10 FILMES de VIV
(por ordem de preferência)
01
Uma RUA CHAMADA PECADO
Direção de Elia Kazan
Elenco: Marlon Brando, Kim Hunter e Karl Malden
Oscar de Melhor Atriz
Melhor Atriz no Festival de Veneza
02
E o VENTO LEVOU
Direção de Victor Fleming
Elenco: Clark Gable, Leslie Howard, Olivia
de Havilland, Thomas Mitchell, Hattie McDaniel, Laura Hope Crews e Jane Darwell
Oscar de Melhor Atriz
03
A PONTE de WATERLOO
Direção de Mervyn LeRoy
Elenco: Robert Taylor, Lucile Watson, Maria Ouspenskaya e C.
Aubrey Smith
04
A NAU dos INSENSATOS
Direção de Stanley Kramer
Elenco: Simone Signoret, José Ferrer, Lee
Marvin, Oskar Werner e Elizabeth Ashley
05
ANNA KARENINA
Direção de Julien Duvivier
Elenco: Ralph Richardson, Kieron Moore e
Martita Hunt
06
LADY HAMILTON, a
DIVINA DAMA
Direção de Alexander Korda
Elenco: Laurence Olivier, Alan Mowbray, Sara Allgood e Gladys
Cooper
07
Em ROMA, na PRIMAVERA
Direção de José
Quintero
Elenco: Warren Beatty, Coral Browne, Jill
St. John e Lotte Lenya
08
O PROFUNDO MAR AZUL
Direção de Anatole Litvak
Elenco: Kenneth More e Eric Portman
09
CÉSAR e CLEÓPATRA
Direção de Gabriel Pascal
Elenco: Claude Rains, Stewart Granger,
Flora Robson, Cecil Parker e Jean Simmons
10
Nos BASTIDORES de LONDRES
Direção de Tim Whelan
Elenco: Charles Laughton e Rex Harrison
10 FILMES de LARRY
(por ordem de preferência)
01
HAMLET
Direção de Laurence Olivier
Elenco: Jean Simmons e Anthony Quayle
02
O MORRO dos VENTOS UIVANTES
Direção de William Wyler
Elenco: Merle Oberon, David Niven, Flora
Robson e Geraldine Fitzgerald
03
PERDIÇÃO por AMOR
Direção de William Wyler
Elenco: Jennifer Jones, Miriam Hopkins e Eddie Albert
04
REBECCA, a MULHER INESQUECÍVEL
Direção de Alfred Hitchcock
Elenco: Joan Fontaine, George
Sanders, Judith Anderson e C. Aubrey Smith
05
MARATONA da MORTE
Direção de John Schlesinger
Elenco: Dustin Hoffman, Roy
Scheider, William Devane e Marthe Keller
06
HENRIQUE V
(The Chronicle
History of King Henry the Fifth with His Battell Fought at Agincourt in France,
1944)
Direção de Laurence Olivier
Elenco: Renée Asherson, Robert Newton,
Leslie Banks e Robert Helpmann
07
SPARTACUS
Direção de Stanley Kubrick
Elenco: Kirk Douglas, Jean
Simmons, Charles Laughton, Peter Ustinov e John Gavin
08
VIDA de ARTISTA
Direção de Tony Richardson
Elenco: Brenda de Banzie,
Roger Livesey, Joan Plowright e Alan Bates
09
TRAMA DIABÓLICA
Direção de Joseph L. Mankiewicz
Elenco: Michael Caine
10
MENTIRA INFAMANTE
Direção de Peter Glenville
Elenco: Simone Signoret, Sarah Miles, Terence Stamp e Hugh Griffith
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