A primeira vez que vi SUSAN HAYWARD (1917 - 1975), à beira da TV, ela era Messalina no pomposo “Demetrius e o Gladiador / Demetrius and the
Gladiators” (1954). Fiquei seduzido. Temperamental, impondo sua
presença na tela com um especial talento para representar mulheres de caráter
forte, sofridas e corajosas, nada glamorosas, a atriz evidencia o carisma das suas heroínas através
de uma figura extremamente fotogênica e de interpretações emocionadas. Apelidada de “A Beldade do
Brooklyn”, trabalhou em mais de 50 películas durante muitas décadas.
Ela travou muitas batalhas na vida privada, assim como na profissional, onde o seu clímax foi sem dúvida o Oscar de Melhor Atriz que
afinal recebeu, em 1958, por “Quero Viver / I Want to Live!”. Obstinada, resistente, disposta a se tornar uma estrela de primeira grandeza, finalmente conheceu o
sabor da consagração a partir do finalzinho dos anos 1940, depois de uma década de
batalha sem tréguas e uma intimidade marcada por escândalos, tentativas de
suicídio e adultério. Nascida numa família modesta, descendente de irlandeses e
suecos, antes dos 20 anos já se virava como modelo publicitário. Uma fotografia
sua numa revista despertou a atenção do diretor George Cukor, empenhado na
escolha da intérprete de Scarlett O’Hara no lendário “...E o Vento Levou / Gone
with the Wind”, sendo submetida a um teste. Fracassou devido ao forte sotaque
nova-iorquino e à inexperiência.
Permaneceu em Hollywood, aceitando pequenos papéis em
produções esquecíveis. Depois de estudar dicção, passou a ter um tom vocal melodioso.
Contratada pela Paramount Pictures, atuou em filmes de sucesso dirigida por William A.
Wellman, Cecil B. DeMille e René Clair. Em plena Segunda Guerra Mundial,
tornou-se uma das musas dos soldados, aparecendo em fotos com trajes curtos e
participando de eventos militares. Da Paramount passou para as mãos do produtor
independente Walter Wanger e no segundo trabalho com ele recebeu indicação ao Oscar de Melhor Atriz, num excelente perfil de uma esposa
alcoólatra em “Desespero / Smah-Up – The Story of a Woman”.
Dois anos depois assinou contrato com a 20th Century-Fox,
tornando-se um poderoso nome nas bilheterias num estúdio cujas estrelas estavam
em declínio (Betty Grable, Linda Darnell, Gene Tierney, Anne Baxter e Jeanne
Crain). Iniciou-se assim um leque de filmes comerciais, tendo como ponto alto
“David e Betsabá / David and Bathsheba” (1951), ao lado de Gregory Peck, um
ensaio bíblico de Henry King de grande popularidade. Em 1952, eleita - ao lado
de John Wayne - como a estrela mais famosa do mundo, fez a cinebiografia da
cantora Jane Forman, cuja carreira é interrompida após um acidente aéreo,
ficando paralítica e retornando à atividade depois de algumas cirurgias.
Ambicionando o papel que daria nova vida à sua trajetória, Jeanne Crain se
decepcionou ao saber que a própria Miss Forman torcia pela escolha de SUSAN
HAYWARD. “Meu Coração Canta / With a Song my Heart” estourou nas bilheterias,
ela concorreu de novo ao Oscar e levou o Globo de Ouro.
Seguiram-se fitas medíocres, embora divida letreiros com astros de
primeira grandeza. “Paixão de Bravo / The Lusty Men” (1952), de Nicholas Ray,
se constitui a exceção mais honrosa. Neste western diferente sobre rodeios, ela
vive um triângulo amoroso, entre o marido (Arthur Kennedy) e seu amigo cowboy
(Robert Mitchum), em ricas tonalidades psicológicas. Ao contrário de sua
projeção sólida no estúdio, na intimidade SUSAN HAYWARD não estava bem. As
desavenças com o marido, ator que nunca deu certo, Jess Barker, pai de seus
dois filhos gêmeos, culminaram com uma contundente agressão física, chegando o
caso aos tribunais, quando já se falava de romances da atriz com o
multimilionário Howard Hughes e também com os atores Jeff Chandler e
Richard Egan. Em 1954, eles se divorciaram.
Abalada com o inesperado casamento de Hughes com a atriz Jean
Peters, também estrela da Fox, mergulhou na depressão e tentou suicídio,
ingerindo barbitúricos em excesso, no ano de 1955. Neste mesmo ano, emprestada
à Metro para outra cinebiografia, desta vez da cantora alcoólatra Lillian Roth,
resultou em composição admirável, concorrendo ao Oscar pela quarta vez por “Eu
Chorarei Amanhã / I’ll Cry Tomorrow”. E perdeu a estatueta mais uma vez. Na ocasião,
um outro escândalo. Envolvida com o coadjuvante Don Barry, notório gigolô, foi acusada de agredir a starlet Jil
Jarmyn, ao pegá-la em flagrante com o amante, dando início a uma briga. Barry,
eximindo-se de qualquer culpa, declarou no tribunal que “no momento estava na
cozinha, preparando um café”. O triângulo ganhou jocosamente as manchetes,
entrando para o anedotário por uma observação maliciosa de Marlene Dietrich:
“Hum, esse Barry deve fazer um café e tanto!”.
Compensando a baixaria, ela levou pelo papel de
Lillian Roth o prêmio de Melhor Atriz no Festival de Cannes. Em 1956 atuou no
lamentável épico sobre Genghis Khan “Sangue de Bárbaros / The Conqueror”,
dirigido pelo ex-ator Dick Powell no deserto de Utah, contaminado
radiotivamente por experiências nucleares e marcando tragicamente o destino da
equipe. Vítimas de câncer, morreriam 46 pessoas desse filme de aventura, entre
eles SUSAN HAYWARD, John Wayne, Agnes Moorehead, Dick Powell, Pedro Armendáriz
(suicidou-se, mas estava doente), Ted De Corsia, John Hoyt, o cenógrafo Carroll
Clark e o maquilador Webb Overlander. Outros 91 membros das filmagens ficaram
doentes. Tal hipótese tornou-se um escândalo, mas nunca realmente foi provada.
Em 1956, namorando o playboy carioca Jorginho Guinle, a atriz
visitou o Brasil. No ano seguinte, casou-se com o maduro e próspero fazendeiro
Floyd Eaton Chalkley, mudando-se para um rancho. Ventos de sorte sopraram no seu
caminho e ela finalmente foi convidada para um extraordinário papel no que viria
a ser um excelente filme, “Quero Viver”, de Robert Wise. O personagem real, uma
mulher vigarista e vulgar, Barbara Graham, executada na câmara de gás, sem que
houvesse provas suficientes para a condenação como homicida. O drama em questão
é um libelo contra a pena de morte e por sua primorosa performance ela levou o
prêmio de Melhor Atriz dos Críticos de Cinema de Nova Iorque, Globo de Ouro e,
enfim, o Oscar.
Feliz no matrimônio e realizada com o reconhecimento da Academia,
a obstinada ruiva pouco a pouco se retirou do cenário artístico. Escolhendo mal seus
últimos papéis, dividiu a cena em 1964 com Bette Davis em “Escândalo na
Sociedade / Where Love has Gone”, dramalhão da safra sensacionalista de Harold
Robbins. As relações entre as duas no estúdio foram tensas e Susan ameaçou processar o produtor Joseph E. Levine por quebra de contrato se o personagem de
Bette se sobressaisse ao seu. Depois de recusar boas oportunidades como “As Três
Máscaras de Eva / The Three Faces of Eve” – que proporcionou um Oscar à Joanne
Woodward; “Doce Pássaro da Juventude / Sweet Bird of Youth”; “Cleópatra / idem”
– ela própria sugeriu o nome de Elizabeth Taylor – e o super sucesso “A
Primeira Noite de um Homem / The Graduate”, experimentou os palcos em 1968,
estrelando o musical “Mame”, mas logo perdeu a voz no esforço diário e foi
substituída por Celeste Holm.
Com a morte do marido, em 1966, refugiou-se no álcool. Em 1972, ao
lado de William Holden, despediu-se do cinema, já doente, usando peruca. Morreu
em 1975, aos 57 anos de idade, vítima de um tumor cancerígeno no cérebro. Sua
última aparição aconteceu na cerimônia do Oscar 1974. Visivelmente debilitada,
se deixou guiar por Charlton Heston. Notável estrela que
passou por muitos diretores ruins, imagino o quanto SUSAN HAYWARD
renderia nas mãos de cineastas talentosos. Sua fascinante beleza explosiva
e temperamento dramático valorizam longas sem importância. Vê-la atuar
é satisfatório, principalmente na obra-prima “Quero Viver”.
FONTES
“Susan Hayward: Portrait of a Survivor”, de
Beverly Linet;
“Cinemin”.
10 PARCEIROS ROMÂNTICOS (no cinema) de SUSAN
O DESTINO ME PERSEGUE
(The President’s
Lady, 1953)
direção de Henry Levin
O AVENTUREIRO DE HONG KONG
(Soldier of Fortune, 1955)
direção de Edward Dmytryk
MEU MAIOR AMOR
(My Foolish Heart, 1949)
direção de Mark Robson
JARDIM DO PECADO
(Garden of Evil, 1954)
direção de Henry Hathaway
AS NEVES DE KILIMANJARO
(The Snows of Kilimanjaro,
1952)
direção de Henry King
A ESQUINA DO PECADO
(Back Street, 1961)
direção de David Miller
ROMANCE DOS SETE MARES
(The Fighting Seabees,
1944)
direção de Edward Ludwig
LÁBIOS SELADOS
(Top Secret Affair,
1957)
direção de H. C. Potter
PAIXÃO DE BRAVO
(The Lusty Men, 1952)
direção de Nicholas Ray
Correio do Inferno
(Rawhide, 1951)
direção de Henry Hathaway
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