Ela tinha cabelos ruivos e olhos azul-esverdeados. Atriz versátil,
não se encaixava no molde da mocinha típica decorativa da Hollywood da época. Trabalhou
com George Cukor, Michael Powell, Elia Kazan, John Huston, Vincente Minnelli,
Otto Preminger, Joseph L. Mankiewicz etc. – nos mais distintos
papéis. E fez sob direção de Fred Zinnemann uma das cenas icônicas do cinema, nos
braços de Burt Lancaster numa praia, em “A Um Passo da Eternidade”. O
erotismo discreto e o talento de DEBORAH KERR (Helensburgh, Escócia. 1921 - 2007) são fundamentais
para o filme. Quando ela diz “Ninguém nunca me beijou como você”, acreditamos nela.
Como a britânica Greer Garson, outra estrela contratada da
Metro-Goldwyn-Mayer, elas projetam na tela uma classe difícil de
encontrar hoje em dia. Refinadas e delicadas, às
vezes certinhas e vulneráveis, jamais frágeis. Sensuais, sem exibição, e naturalmente
belas. Ao lado de Garson e Jean Simmons, DEBORAKH KERR foi a “atriz inglesa” por excelência
da era de ouro de Hollywood, com o negativo e o positivo que este rótulo
implica. Muita gente maldosa contava com um escândalo em sua trajetória. Nunca aconteceu. Nem mesmo quando, casada, teve discreto romance com
Burt Lancaster durante as filmagens de “A Um Passo da Eternidade”.
Sua fértil carreira mostra que nela borbulha paixão sob o exterior
controlado. Indicada seis vezes ao Oscar de Melhor Atriz, não levou a cobiçada estatueta. Concertando a injustiça, em 1994 a Academia de Artes
e Ciências Cinematográficas de Hollywood lhe deu o Oscar Honorário, em
reconhecimento a “uma artista de graça e beleza impecáveis, uma atriz dedicada
cuja imagem sempre foi sinônimo de disciplina, perfeição e elegância”. Além da
formosura, esta atriz de expressivo talento dramático, entregava-se aos
personagens. Desses, a professora Anna Leonowens em “O Rei e Eu / The King and
I” (1956), ao lado de Yul Brynner, talvez seja lembrado com mais carinho.
Filha de militar, tímida e insegura, com a ajuda de uma tia,
estrela do rádio, estreou no
teatro londrino aos dezessete anos, no corpo de baile do espetáculo “Prometheus”.
Do primeiro papel no cinema, em 1941, como religiosa do Exército da Salvação em
“Major Barbara / Idem”, protagonizado por Rex Harrison, aos três
personagens em “Coronel Blimp – Vida e Morte / The Life and Death of Colonel
Blimp” (1943), em pouco tempo se tornou uma das principais atrizes do
cinema britânico. Em “Narciso Negro” (1947), de Emeric Pressburger e Michael
Powell (ele confessou em sua autobiografia a paixão que sentia pela atriz), vive
a orgulhosa irmã Clodagh, líder de um grupo de freiras que tenta estabelecer um
espaço católico em antigo harém no Himalaia. A atuação de DEBORAH KERR cintila.
Reconhecida pelo Círculo dos Críticos de Cinema de Nova York como
Melhor Atriz do ano por suas performances neste drama religioso e no thriller “Um Estranho na Escuridão / I See a Dark Stranger” (1946), chama
a atenção de Louis B. Mayer, poderoso chefão da M-G-M. Impressionado, ele
diz que o sobrenome Kerr rima com estrela, levando-a para Hollywood em 1947, com um dos mais
altos salários já pagos pelo estúdio. A estreia acontece ao lado de Clark Gable e Ava
Gardner em “O Mercador de Ilusões / The Hucksters”. O fraco roteiro desperdiça um elenco de ouro.
Prestigiada como estrela de primeira grandeza, DEBORAH KERR se
sentiu constrangida pela sucessão de papéis em que representava mulheres superficiais, honoráveis
e reservadas, muitas vezes quase inúteis, em épicos e aventuras.
Ganhando a reputação de “lady” – fina, digna, um pouco gélida -, fez uma
legião de fãs. Lutando para superar este rótulo, mostrou disposição para outros
personagens.
No clássico “As Minas do Rei Salomão / King Solomon’s Mines” (1950), filmado em locações na África, ela empolga com sexualidade e vulnerabilidade, trazendo novas dimensões para um filme de ação orientado para o público masculino. No decorrer da trama, tem seu guarda-roupa rasgado em tiras e enfrenta perigos. Um divertimento lindamente filmado, captando a atriz em technicolor e cabelo vermelho flamejante ao vento.
No clássico “As Minas do Rei Salomão / King Solomon’s Mines” (1950), filmado em locações na África, ela empolga com sexualidade e vulnerabilidade, trazendo novas dimensões para um filme de ação orientado para o público masculino. No decorrer da trama, tem seu guarda-roupa rasgado em tiras e enfrenta perigos. Um divertimento lindamente filmado, captando a atriz em technicolor e cabelo vermelho flamejante ao vento.
Ao
ser emprestada a Columbia Pictures para “A Um Passo da Eternidade”, substituindo
Joan Crawford, teve oportunidade de provar sua versatilidade, seduzindo os críticos e chocando o público como Karen Holmes, a infeliz e adúltera esposa
de um militar. A cena do beijo apaixonado entre ela e Burt Lancaster na praia
do Havaí fez história. A partir daí, deixou um
legado de poderosas atuações.
Em 1953, estreou na Broadway com a peça “Chá e Simpatia”, de
Robert Anderson, fazendo o mesmo papel no cinema sob a direção de Vincente
Minnelli: a esposa de professor, simpatizante de um estudante (John Kerr)
inseguro da sexualidade. Com discurso homossexual datado, o ousado filme encanta com as performances notáveis de ambos os Kerr (eles não eram parentes). Batendo
recordes de bilheteria, ela protagonizou o romântico e charmoso melodrama
“Tarde Demais para Esquecer”, ao lado do galã Cary Grant. Remake de “Duas Vidas / Love Affair” (1939),
com Charles Boyer e Irene Dunne,
inspiraria no futuro outra versão menos bem sucedida, “Segredos do Coração / Love
Affair” (1994), com Warren Beatty e Annette Bening.
Ainda na década de cinquenta, DEBORAH KERR brilha no musical “O Rei e Eu”, dublada por Marian Nixon
(Maureen O'Hara foi convidada para o papel, mas Yul Brynner exigiu
Deborah), e no drama “Vidas Separadas”, adaptação da peça de Terence Rattigan,
como uma solteirona solitária alienada por uma mãe dominadora (fabulosa Gladys Cooper). O desempenho,
reservado e discreto, comove. Está também muito bem no intimista “O Céu por
Testemunha”, sobre freira e fuzileiro juntos em uma ilha no Pacífico durante a
Segunda Guerra Mundial. Neste belo filme, a química entre a atriz e Robert
Mitchum, aparentemente díspares, é inquietante. No inicio das filmagens, o astro
irreverente se preocupou com a fama de “moça bem comportada” da colega. Depois
que ela xingou John Huston durante um take, ele caiu na risada e se tornaram amigos (a amizade durou até
a morte do ator, em 1997).
“A Noite do Iguana”, de Tennessee Williams, foi outro bom momento da atriz. Faz uma quarentona lésbica, enfrentando Richard Burton,
padre depravado e ébrio acusado de seduzir a adolescente Sue Lyon na costa do
México. Em 1969, depois de filmar com Elia Kazan e John Frankenheimer, em obras
injustamente atacadas pelos críticos, ela decidiu deixar o cinema e morar na
Suíça – depois na Espanha -, decepcionada com a sexualidade e a violência em
excesso nas telas de então. No período que se seguiu, participou de peças
teatrais na Broadway – entre elas, a Prêmio Pulitzer “Seascape” (1975), de Edward
Albee - e de um punhado de bem cuidados filmes para a televisão.
Na vida pessoal, casou-se com o inglês Anthony Bartley em 1945, piloto de
caça condecorado durante a Segunda Guerra Mundial, divorciando-se em
1959. No ano seguinte, novo casamento com o escritor e roteirista Peter Viertel (“Sabotador / Saboteur”, de Hitchcock, 1942; “Resgate de Sangue / We Were Strangers”, de John Huston, 1949; “E Agora Brilha o Sol / The Sun Also Rises”, de Henry King, 1957), cuja
mãe era a melhor amiga de Greta Garbo, ficando com ele o resto da vida. A meiga
e inteligente DEBORAH KERR morreu em Suffolk, na Inglaterra, por problemas
decorrentes do Mal de Parkinson. Ela, seu marido e o biógrafo dela, Eric Braun,
morreram no espaço de cinco semanas, no outono de 2007. Todos aos 86 anos.
A última aparição pública da estrela aconteceu em 1994, ao ser
premiada com o Oscar Honorário. Na noite da cerimônia, Glenn Close apresentou a
homenagem especial ao seu trabalho, e o público assistiu clipes de seus lendários
filmes. DEBORAH KERR apareceu em alinhado modelo azul-turquesa,
e recebeu ovação de pé. Timidamente, disse: “Eu nunca estive tão assustada na
minha vida, mas me sinto melhor agora, porque eu sei que estou entre amigos.
Obrigada por me darem uma vida feliz”. Após a fala emocionada, outra ovação.
Foi o adeus oficial a Hollywood.
Uma das suas duas filhas, Francesca Schrapnel, garante que a
mãe nunca teve um filme favorito entre tantos que estrelou. A
família, no entanto, tem predileção por “O Peregrino da Esperança”, um premiado drama que se passa no interior australiano.
Fontes: “Deborah Kerr” (1977), de Eric Braun; e “Deborah Kerr – A Biography” (2010), de Michelangelo Capua.
10 FILMES de Miss KERR
(por ordem de preferência)
01
NARCISO NEGRO
direção de Michael Powell e Emeric Pressburger
com David Farrar, Flora Robson, Sabu
e Jean Simmons
Melhor Atriz do Círculo dos Críticos de Cinema de Nova York
02
Os INOCENTES
direção de Jack Clayton
com Michael Redgrave, Martin Stephens e Pamela Franklin
03
O CÉU por TESTEMUNHA
direção de John Huston
com Robert Mitchum
Melhor Atriz do Círculo dos Críticos de Cinema de Nova York
04
TARDE DEMAIS para ESQUECER
direção de Leo McCarey
com Cary Grant e Cathleen Nesbitt
05
A um PASSO da ETERNIDADE
direção de Fred Zinnemann
com Burt Lancaster,
Montgomery Clift, Donna Redd
e Frank Sinatra
06
CHÁ e SIMPATIA
direção de Vincente Minnelli
com John Kerr
07
BOM DIA, TRISTEZA
direção de Otto Preminger
com David Niven, Jean Seberg e Walter Chiari
08
VIDAS SEPARADAS
direção de Delbert Mann
com Rita Hayworth,
David Niven, Wendy Hiller
e Burt Lancaster
David di Donatello de Melhor Atriz Estrangeira
09
O PEREGRINO da ESPERANÇA
direção de Fred Zinnemann
com Robert Mitchum, Peter Ustinov e Glynis Johns
Melhor Atriz do Círculo dos Críticos de Cinema de Nova York
10
A NOITE do IGUANA
direção de John Huston
com Richard Burton,
Ava Gardner e Sue Lyon
8 comentários:
Tarde demais para esquecer. Um filme romântico para nunca esquecer.
Minha atriz favorita!
Grande atriz e uma mulher muito bonita. Muito lembrada pelo romântico "Tarde Demais Para Esquecer" além da famosa cena na praia de "A Um Passo da Eternidade". Dentre seus filmes que mais gosto, cito "Narciso Negro", "Quo Vadis", "O Rei e Eu", "O Céu por Testemunha" e "Os Inocentes".
Querido Amigo adoro olhar o seu BLOG. Aprendo a exercitar mais e mais o desejo de poder olhar assuntos interessantes. PArabéns.bjos.Saudades.
Grande trabalho a respeito da grande Deborah Kerr.
Apareceu nua no final de carreira, no filme OS PARAQUEDISTAS ESTÃO CHEGANDO, com Burt Lancaster!
Um grande trabalho da grande atriz, Deborah Kerr.
Apesar de ser uma moça bem comportada, apareceu nua numa cena com o grande Burt Lancaster, no filme Os paraquedistas Estão Chegando.
Oi Antonio, a primeira foto, em que ela está sentada, parece com a cena do Tarde Demais ... quando o Cary Grant vai ao apartamento dela e descobre que está paralítica, uma cena que nunca me saiu da cabeça, mas a roupa não me parece a mesma. Você é novinho, não sei se assistiu, que acha? Bom, vai daí que fui dar uma olhada no meu querido Burt Lancaster porque me lembrava de uma entrevista (do Hector Babenco!) de uns anos atrás sobre ele ser homossexual e, para minha surpresa, achei este tuber bom de fofoca. Você conhece? https://www.youtube.com/watch?v=ry6zMH_mzQ0 Pelo jeito nossa querida Debora, apesar do Gregory, não pecou, rs.
Belíssima mulher. Saudade...
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