maio 30, 2012

*********** MOCINHAS e GAROTAS de SALOON

john wayne e gail russell em “o anjo e o malvado”

O francês André Bazin, um dos papas da crítica cinematográfica, definiu o faroeste como o “cinema norte-americano por excelência”. Durante muito tempo foi, de fato, o gênero mais popular de Hollywood. Os faroestes lotavam as matinês, abarrotadas de rapazes vibrando com as peripécias de destemidos cowboys, salvando MOCINHAS contra ataques de índios, mexicanos e bandoleiros. Essa “grandeza ingênua”, na definição exemplar de Bazin, pode ser o elemento cativante de seu público há tanto tempo. É fácil a identificação com esses heróis, fortes na luta e, ao mesmo tempo, impulsionados por princípios que atestarão o seu valor pessoal, graças ao respeito pelas leis sociais e morais (que o farão ganhar o amor da mocinha). 

Nesse gênero, basicamente masculino, algumas garotas de personalidade se destacam: Belle Starr/Gene Tierney em “Bela e Formosa / The Bandit Queen” (1941), Calamity Jane/Doris Day em “Ardida como Pimenta / Calamity Jane” (1953), Altar Keane/Marlene Dietrich em “O Diabo Feito Mulher / Rancho Notorious” (1952) ou Vienna/Joan Crawford em “Johnny Guitar / Idem” (1954). No entato, a maior de todas é Barbara Stanwyck, a Rainha do faroeste. Ela fez vários papéis de fazendeira autoritária, poderosa ou malvada. Em “Almas em Fúria”, de Anthony Mann, sua Vance Jeffords briga com o pai, rasga o rosto da madrasta com uma tesoura e cavalga audaciosamente.

Em geral, no faroeste o feminino tem um papel secundário, de mocinha virgem, professorinha casadoira ou GAROTAS de SALOON (prostitutas, mas destemidas e de “bons princípios”). A donzela encontra obstáculos em sua jornada que só será possível ultrapassar com a ajuda de um mocinho-pistoleiro casca-grossa, que termina por conquistar seu coração. Com raras exceções, não me preocupo com o destino dessas garotas pudicas (por exemplo, a Grace Kelly de “Matar ou Morrer / High Noon”, 1952, é dispensável, sou mais a Katy Jurado), preferindo moças que circulam à vontade pelos saloons da vida. Algumas estrelas são especialistas nesse tipo de personagem, quase sempre com firmeza de caráter, caso de Claire Trevor ou Virginia Mayo. Mas qual seriam as atrizes mais importantes do faroeste?

ALEXIS SMITH
(1921 - 1993. British Columbia / Canadá)

Principais Faroestes:

SAN ANTONIO, CIDADE SEM LEI (Idem, 1945), direção de David Butler; MERCADORES de INTRIGAS (South of St. Louis, 1949), direção de Ray Enright; MONTANA, TERRA PROIBIDA (Montana, 1950), direção de Ray Enright.

ANNE BAXTER
(1923 - 1985. Michigan, Indiana / EUA)

Principais Faroestes:

CÉU AMARELO (Yellow Sky, 1949), direção de William A. Wellman; TRINDADE VIOLENTA (Three Violent People, 1956), direção de Rudolph Maté; CIMARRON (Idem, 1960), direção de Anthony Mann.

BARBARA STANWYCK
(1907 - 1990. Nova Iorque / EUA)

Principais Faroestes:

ALMAS em FÚRIA (The Furies, 1950), direção de Anthony Mann;  Um PECADO em CADA ALMA (The Violent Men, 1955), direção de Rudolph Maté; DRAGÕES da VIOLÊNCIA (Forty Guns, 1957), direção de Samuel Fuller.

CLAIRE TREVOR
(1910 - 2000. Nova Iorque / EUA)

Principais Faroestes:

No TEMPO DAS DILIGÊNCIAS (Stagecoach, 1939), direção de John Ford; COMANDO NEGRO (Dark Command, 1940), direção de Raoul Walsh; HOMEM SEM RUMO (Man Without a Star, 1955), direção de King Vidor.

DONNA REED
(1921 - 1986. Denison, Iowa / EUA)

Principais Faroestes:

IRMÃOS INIMIGOS (Gun Fury, 1953), direção de Raoul Walsh; AVENTURA SANGRENTA (The Far Horizons, 1955), direção de Rudolph Maté; PUNIDO pelo PRÓPRIO SANGUE (Backlash, 1956), direção de John Sturges.

DOROTHY MALONE
(1925 - 2018. Chicago, Illinois / EUA)

Principais Faroestes:

GOLPE de MISERICÓRDIA (Colorado Territory, 1949), direção de Raoul Walsh; MINHA VONTADE é a LEI (Warlock, 1959), direção de Edward Dmytryk; O ÚLTIMO PÔR-DO-SOL (The Last Sunset, 1961), direção de Robert Aldrich.

ELLEN DREW
(1915 - 2003. Kansas City, Missouri / EUA)

Principais Faroestes:

No VELHO COLORADO (The Man from Colorado, 1948), direção de Henry Levin; O TESTAMENTO de DEUS (Stars in my Crown, 1950), direção de Jacques Tourneur; TERRA do INFERNO (Man in the Saddle, 1951), direção de Andre de Toth.

GAIL RUSSELL
(1924 - 1961. Chicago, Illinois / EUA)

Principais Faroestes:

O ANJO e o MALVADO (Angel and the Badman, 1947), direção de James Edward Grant; BARREIRAS de SANGUE (El Paso,1949), direção de Lewis R. Foster; SETE HOMENS SEM DESTINO (Seven Men from Now, 1956), direção de Budd Boetticher.

JANE RUSSELL
(1921 - 2011. Bemidji, Minnesota / EUA)
        
 Principais Faroestes: 

O PROSCRITO (The Outlaw, 1943), direção de Howard Hawks e Howard Hughes; BELA e BANDIDA (Montana Belle, 1952), direção de Allan Dwan;  Nas GARRAS da AMBIÇÃO (The Tall Men, 1955), direção de Raoul Walsh.

JOANNE DRU
(1922 - 1996. Logan, West Virginia / EUA)

Principais Faroestes:

RIO VERMELHO (Red River, 1948), direção de Howard Hawks; LEGIÃO INVENCÍVEL (She Wore a Yellow Ribbon, 1949), direção de John Ford; CARAVANA de BRAVOS (Wagon Master, 1950), direção de John Ford.

JULIE ADAMS
(1926 - 2019. Waterloo, Iowa / EUA)

Principais Faroestes:

E o SANGUE SEMEOU a TERRA (Bend of the River, 1952), direção de Anthony Mann; IMPÉRIO do PAVOR (Horizons West, 1952), direção de Budd Boetticher; BANDO de RENEGADOS (The Lawless Breed, 1953), direção de Raoul Walsh.

MAUREEN O’HARA
(1920 - 2015. Ranelagh, Dublin / Irlanda)

Principais Faroestes:

BUFFALO BILL (Idem, 1944), direção de William A. Wellman; RIO BRAVO (Idem, 1950), direção de John Ford; RAÇA BRAVA (The Rare Breed, 1966), direção de Andrew V. McLaglen.

RHONDA FLEMING
(nasceu em 1923. Los Angeles, Califórnia / EUA)

Principais Faroestes:

As AVENTURAS de BUFFALO BILL (Pony Express, 1953), direção de Jerry Hopper; A AUDÁCIA é a MINHA LEI (Tennessee’s Partner, 1955), direção de Allan Dwan; SEM LEI e SEM ALMA (Gunfight at O.K. Corral, 1956), direção de John Sturges.

RUTH ROMAN
(1922 - 1999. Lynn, Massachusetts / EUA)

Principais Faroestes:

VINGADOR IMPIEDOSO (Dallas, 1950), direção de Stuart Heisler; REGIÃO de ÓDIO (The Far Country, 1954), direção de Anthony Mann; SANGUE da TERRA (Blowing Wild, 1954), direção de Hugo Fregonese.

SHELLEY WINTERS
(1920 - 2006. St. Louis, Missouri / EUA)

Principais Faroestes:

WINCHESTER 73 (Idem, 1950), direção de Anthony Mann; PACTO de HONRA (Saskatchewan, 1954), direção de Raoul Walsh; REVANCHE SELVAGEM (The Scalphunters, 1968), direção de Sidney Pollack.

VERA MILES
(nasceu em 1930. Boise City, Oklahoma / EUA)

Principais Faroestes:

CHOQUE de ÓDIOS (Wichita, 1955), direção de Jacques Tourneur; RASTROS de ÓDIO (The Searchers, 1956), direção de John Ford; O HOMEM que MATOU o FACÍNORA (The Man From who Shot Liberty Valance, 1962), direção de John Ford.

VIRGINIA MAYO
(1920 - 2005. St. Louis, Missouri / EUA)

Principais Faroestes:

GOLPE de MISERICÓRDIA (Colorado Territory, 1949), direção de Raoul Walsh; EMBRUTECIDOS pela VIOLÊNCIA (Along the Great Divide, 1951), direção de Raoul Walsh; À BORDA da MORTE (The Proud Ones, 1956), direção de Robert D. Webb.

YVONNE de CARLO
(1922 - 2007. Vancouver, British Columbia / Canadá)

Principais Faroestes:

CORAÇÃO SELVAGEM (Tomahawk, 1951), direção de George Sherman; PECADORES de SÃO FRANCISCO (The San Francisco Story, 1952), direção de Robert Parrish; SOB a LEI da CHIBATA (Passion, 1954), direção de Allan Dwan.

maio 17, 2012

*************** O CORCUNDA de VICTOR HUGO



A coexistência do grotesco e do sublime e, ao mesmo tempo, as fronteiras que os separam, constituem-se em ponto de partida do cruel romance medieval O CORCUNDA de NOTRE DAME (1831), de Victor Hugo. Fascinado pela imaginação criadora do autor, desde garoto leio e releio essa obra-prima. Quando estive em Paris pela primeira vez, visitei a casa-museu do autor e subi uma das torres da catedral gótica francesa com o livro colado ao peito. Emocionado, sentia-me o próprio protagonista disforme, mas também terno, ingênuo e apaixonado. Desenvolvendo paixões impossíveis e despertando no leitor as mais variadas emoções, o escritor reuniu magistralmente em uma mesma narrativa religiosos e vagabundos, ciganos e nobres, padres e vilões.

A história é centrada no coxo e corcunda Quasímodo. Adotado pelo diácono Claude Frollo e vivendo em Notre Dame, ele enfrenta uma série de peripécias por conta de um amor não correspondido pela bela e sedutora cigana Esmeralda. Frollo, colocando em risco o seu celibato, também se apaixona por ela, mas são duas formas de amar diferentes. Quasímodo ama-a generosamente, enquanto Frollo nutre uma paixão desesperada, repleta de desejo sexual. No entanto, Esmeralda não corresponde ao amor de nenhum dos dois, preferindo Phoebus, um soldado tolo, formoso e noivo que não tem nenhum tipo de sentimento especial por ela.

maureen o'hara é esmeralda
 em 1939
O livro não está unicamente baseado nesses amores desencontrados que terminam em tragédia. Toda a luta de classes na sociedade francesa do século XV é exposta: mendigos criando uma corte marginal chamada de “O Pátio dos Milagres”, burgueses assistindo aos espetáculos bárbaros e injustos de torturas na Praça de Grève, soldados cometendo crimes impunemente, diáconos traindo sua religião, ciganos ganhando a vida nas ruas e o próprio rei da época, Luís XI. Existem capítulos inteiros que, ao invés de abordarem Esmeralda ou Quasímodo, falam da catedral ou do monarca.

Desde o seu lançamento, O CORCUNDA de NOTRE DAME popularizou-se e foi adaptado à ópera. Chegou ao cinema em 1911. Com exceção das duas primeiras versões, vi todas as outras e, seguramente, a de 1939, dirigida pelo alemão William Dieterle, é a melhor de todas. A de 1956, de Jean Dellanoy, é frouxa, quase sonífera. E você, amigo(a) leitor(a), curte especialmente alguma das versões do clássico de Victor Hugo? Qual o seu Quasímodo favorito? E Esmeralda?

TODAS as VERSÕES

NOTRE DAME de PARIS
(1911)
direção de Albert Capellani
Com Henry Krauss, Stacia Napierkowska e Claude Garry

Produção francesa que se perdeu ao longo do tempo.

ESMERALDA
(1922)
direção de Edwin J. Collins
Com Sybil Thorndike, Booth Conway 
e Arthur Kingsley

Da Inglaterra, estrelado pela mítica atriz teatral Sybil Thorndike.

O CORCUNDA de NOTRE DAME
(The Hunchback of Notre Dame, 1923)
direção de Wallace Worsley
Com Lon Chaney, Patsy Ruth Miller e Ernest Torrance

Superprodução da Universal muito bem sucedida, arrecadando mais de três milhões de dólares e elogiada pelos críticos. Sustenta-se principalmente na magistral atuação de Lon Chaney, conhecido como “o homem das mil faces”.

O CORCUNDA de NOTRE DAME
(The Hunchback of Notre Dame, 1939)
direção de Willian Dieterle
Com Charles Laughton, Maureen O’Hara, Thomas Mitchell,
Sir Cedric Hardwicke, Edmond O’Brien e Harry Davenport

Um filme de interpretações memoráveis (destacando-se Charles Laughton, Sir Cedric Hardwicke e Thomas Mitchell) e trilha sonora fabulosa de Alfred Newman.  A reconstituição da Paris da Idade Média é perfeita. Estreias de Edmond O’Brien e O’Hara (no cinema hollywoodiano). Uma experiência vibrante e emocionante. Grande adaptação do romance de Hugo. Recebeu duas indicações ao Oscar.

O CORCUNDA de NOTRE DAME
(Notre-Dame de Paris, 1956)
direção de Jean Delannoy
Com Anthony Quinn, Gina Lollobrigida e Alain Cuny

Luxuosa co-produção entre França e Itália, onde os atores Quinn e Lollobrigida estão perdidos, beirando a canastrice. A direção de Dellanoy é teatral e insossa. Cuny, como Frollo, leva o drama nas costas. Vale também pela beleza e sensualidade de Lollobrigida, então no auge da popularidade.

O CORCUNDA de NOTRE DAME
(The Hunchback of Notre Dame, 1982)
direção de Michael Tuchner
Com Anthony Hopkins, Lesley-Anne Down, Derek Jacobi,
John Gielgud e Robert Powell

Curioso telefilme com ótimo elenco. Hopkins, como o habitual, rouba a cena.

O CORCUNDA de NOTRE DAME
(The Hunchback of Notre Dame, 1996)
direção de Gary Trousdale e Kirk Wise
Dublado originalmente por Tom Hulce, Demi Moore 
e Kevin Kline

Boa animação da Disney, que mesmo açucarando o argumento sombrio não perdeu de vista o fio condutor do original.

O CORCUNDA de NOTRE DAME
(The Hunchback, 1997)
direção de Peter Medak
Com Mandy Patinkin, Richard Harris e Salma Hayek

Versão para a tevê com brilhante atuação de Richard Harris como Frollo. Destaque para a cena em que Esmeralda é torturada pela Inquisição.