julho 14, 2019

********* MESTRE INGMAR BERGMAN – 101 ANOS

bibi andersson e liv ullmann
em “persona-quando duas mulheres pecam”



Poeta da alma, o sisudo diretor, roteirista e dramaturgo sueco INGMAR BERGMAN (14 de julho de 1918 - 2007. Uppsala, Uppsala län / Suécia) faria este mês cento e um anos de nascimento. Ao longo de sua vasta filmografia, deixou inúmeros clássicos. Autor de um cinema intimista, interiorizado, voltado para dramas cotidianos e para a micropsicologia das relações amorosas. Mesmo com um legado imenso, é possível afirmar que a principal marca de sua obra são as questões existenciais. Seus personagens enfrentam angústias complexas relacionadas à vida familiar, dilemas com a fé, a solidão e a morte.

Ele marcou a história do cinema com obras de primor estético e roteiros surpreendentes. Nove vezes indicado ao Oscar, assinou mais de 50 filmes, sem contar peças de teatro e produções televisivas. Estudou na Universidade de Estocolmo, onde se interessou por teatro e, mais tarde, por cinema. Iniciou a trajetória profissional em 1941, escrevendo a peça “Morte de Kasper”. Em 1944, INGMAR BERGMAN desenvolveu seu primeiro argumento, para o filme “Tortura do Desejo / Hets”, de Alf Sjöberg. Realizou o primeiro filme em 1945, “Crise / Kris”. Suas influências na escrita provêm do teatro: Henrik Ibsen e August Strindberg.


Teve um romance e uma filha com Liv Ullmann. Dirigiu a atriz em dez filmes, começando por “Persona – Quando Duas Mulheres Pecam”. Um dos melhores comentários sobre INGMAR BERGMAN partiu de Jean-Luc Godard, em “Bergmanorama”, “Cahiers du Cinéma”, julho, 1958: “O cinema não é um ofício. É uma arte. Cinema não é um trabalho de equipe. O diretor está só diante de uma página em branco. Para Bergman estar só é se fazer perguntas; filmar é encontrar as respostas. Nada poderia ser mais classicamente romântico”. Ele morreu em sua casa em Fårö, aos 89 anos, no mesmo dia em que faleceu Michelangelo Antonioni.

Diretor obrigatório para todos que amam cinema, em comemoração aos seus cento e um anos listei 13 filmes essenciais de sua cinematografia. Confira.

bengt ekerot e max von sydow em “o sétimo selo”


13 FILMES ESSENCIAIS de BERGMAN
(por ordem de preferência)

01
GRITOS e SUSSURROS
(Viskningar och Rop, 1972)

Elenco: Harriet Andersson, Liv Ullmann, Kari Sylwan, Ingrid Thulin, Anders Ek e Erland Josephson

David di Donatello de Melhor Diretor Estrangeiro
Melhor Filme e Melhor Diretor do Círculo dos Críticos de Cinema de Nova Iorque

Sensível, elegante e impactante. Uma mulher tem câncer terminal e vai para a casa da família, em um lugar rural, para ser cuidada por suas duas irmãs. Na realidade, quem cuida dela é a empregada que tem um carinho especial por ela. É uma produção excepcional, desde a direção de arte com foco nas cores até a magia da fotografia que dá um realce para a melancolia das personagens. Roteiro complexo e magnífico. Direção iluminada e um show de grandes interpretações.

02
MORANGOS SILVESTRES
(Smultronstället, 1957)

Elenco: Victor Sjöström, Bibi Andersson, Ingrid Thulin, Gunnar Björnstrand, Naima Wifstrand e Max von Sydow 

Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro
Urso de Ouro no Festival de Berlim

Fala sobre o envelhecimento e as perdas que acontecem ao longo do caminho. A solidão e a recordação da juventude fazem desta produção uma lição de vida. Mergulha na memória e no tempo, enquanto segue uma viagem de carro de um idoso professor de medicina (extraordinário Victor Sjöstrom), que receberá um prêmio por seus 50 anos de carreira. No trajeto, ele relembra seu passado e filosofa na companhia de sua nora e de um grupo de jovens que pede carona.

03
LUZ de INVERNO
(Nattvardsgästerna, 1962)

Elenco: Ingrid Thulin, Gunnar Björnstrand, Gunnel Lindblom e Max von Sydow

Segundo capítulo da trilogia “O Silêncio de Deus”, completada por “Através de um Espelho” (1961) e “O Silêncio” (1963), segue a inquietação do pastor de uma pequena igreja rural, que atravessa uma grave crise de fé, encontrando consolo junto de uma professora que não crê em Deus. Entre as tentativas de falar com o Senhor e a relação agressiva com a amante, o clérigo lida, ainda, com o suicídio de um congregado. A interpretação de Gunnar Björnstrand é algo de outro mundo, mergulhando na crise de fé na qual se encontra o pastor ao constatar que “Deus está silencioso. Inspirado pela “Sinfonia dos Salmos”, de Stravinsky; por um relato de um reverendo; e por “Diário de Um Pároco de Aldeia”.

04
O SILÊNCIO
(Tystnaden, 1963)

Elenco: Ingrid Thulin, Gunnel Lindblom e Birger Malmsten

Causou enorme polêmica no lançamento. De reiteradas análises, até discussões no parlamento sueco sobre o conteúdo. Viajando, duas irmãs (extraordinárias Thulin e Gunnel Lindblom), numa relação doentia, de dependência, inveja e raiva, e que é testemunhada (e disputada) pelo pequeno filho de uma delas. Quase desprovido de diálogos, são relações humanas estabelecidas pela incomunicabilidade. Temos uma história de afastamentos, de barreiras entre pessoas que se deviam amar. A sugestão da relação incestuosa o levou a ser proibido nalguns países, enquanto nos Estados Unidos foi etiquetado de pornográfico.

05
O SÉTIMO SELO
(Det Sjunde Inseglet, 1956)

Elenco: Max von Sydow , Gunnar Björnstrand, Bengt Ekerot,Bibi Andersson, Gunnel Lindblom e Anders Ek

Obra-prima muito elogiada. Um ex-cruzado volta à sua terra natal devastada pela peste negra. Em uma jornada física e espiritual, o cavaleiro Antonius (magnífico Max Von Sydow) questiona a existência de Deus enquanto precisa encarar sua própria finitude. É do filme a famosa cena em que o cavaleiro joga uma partida de xadrez com a Morte. Apesar de ter sido rodado em apenas 36 dias e com meios bastante modestos, tem vários refinamentos em sua fatura. O diretor recorre a figurações para dar contornos ao drama, uma reflexão sobre a precariedade da condição humana, o sentido da vida, a busca de Deus.

06
A HORA do LOBO
(Vargtimmen, 1968)

Elenco: Max von Sydow, Liv Ullmann, Erland Josephson, Naima Wifstrand e Ingrid Thulin

Um dos filmes mais peculiares do diretor por apresentar uma narrativa diferente do que estávamos acostumados a vê-lo abordar. A começar por ser a sua única obra gótica, traz ainda um tom de mistério para não dizer de terror. Tudo é contado com base em um diário. A protagonista desde o início já nos avisa que é uma encenação de algo que ocorreu, já nos preparando para o que iria acontecer. Temas como raiva e loucura estão presentes. Um dos mais belos e poéticos dramas de terror jamais visto. Magníficas atuações de Sydow e Ullmann.

07
A FONTE da DONZELA
(Jungfrukällan, 1960)

Elenco: Max von Sydow, Birgitta Valberg, Gunnel Lindblom e Birgitta Pettersson

Oscar de Melhor Filme Estrangeiro
Globo de Melhor Filme Estrangeiro

Retorna ao período medieval que o diretor já havia retratado em “O Sétimo Selo”. Recriando realismo uma Suécia rural do século XIV, em que a religião tem papel central na narrativa, pois a garota que é estuprada – em uma cena crua e impecável – é filha de pais religiosos e sua morte ocorre quando ela estava indo à igreja. O filme não apenas chocar com o ato, mas também trabalha o tema da vingança e do perdão. Um drama para não esquecer.

08
PERSONA – QUANDO DUAS MULHERES PECAM
(Persona, 1966)

Elenco: Bibi Andersson, Liv Ullmann e Gunnar Björnstrand

Brilhante atuação de Ullmann como uma atriz de sucesso que recebe os cuidados de uma enfermeira. Ela não está doente, apenas não fala, mas ouve tudo o que a outra diz. Obra impactante, de complexo roteiro psicológico. Inovador e belíssimo, lançado no Brasil com um infame título. Repleto de experimentações estéticas, de close-ups constantes e uma metamorfose das duas faces, permite progredir a intensidade do misterioso drama, situado em um chalé isolado na ilha de Fårö. Explorando a relação entre essa atriz que ficou muda e sua enfermeira, o drama lindamente filmado questiona os fundamentos instáveis da identidade.

09
FANNY & ALEXANDER
(Fanny och Alexander, 1982)

Elenco: Pernilla August, Lena Olin, Harriet Andersson, Gunnar Björnstrand, Erland Josephson   e Ewa Fröling

Oscar de Melhor Filme Estrangeiro
Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro
César de Melhor Filme Estrangeiro
David Di Donatello de Melhor Filme Estrangeiro e Melhor Diretor Estrangeiro
Melhor Filme Estrangeiro da Associação dos Críticos de Cinema de Los Angeles
Melhor Diretor e Melhor Filme Estrangeiro do Círculo dos Críticos de Cinema de Nova Iorque

De tom autobiográfico, dá especial atenção ao ponto de vista de um irmão e uma irmã, da infância até a idade adulta. Indicado em seis categorias no Oscar, levou quatro estatuetas. Este suntuoso épico familiar foi comparado aos romances de Charles Dickens. A versão em tela grande de três horas foi montada a partir de telefilme de cinco horas. Em uma pesquisa realizada em 2002 pela revista britânica “Sight and Sound” com diretores e críticos, ficou em terceiro lugar entre os melhores filmes dos 25 anos anteriores, atrás de “Apocalypse Now / Idem” e “O Touro Indomável / Raging Bull”.

10
SONATA de OUTONO
(Höstsonaten, 1978)

Elenco: Ingrid Bergman, Liv Ullmann, Lena Nyman, Gunnar Björnstrand e Erland Josephson

Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro

No centro da questão, as relações familiares. O confronto central se dá entre mãe e filha. A mãe famosa tem um certo desprezo pela filha tímida e reprimida e prefere a arte que sua família. Há de se destacar a interpretação espetacular de Ingrid Bergman (que perdeu o Oscar para Jane Fonda). Liv Ullmann, como sempre, também está excelente.

11
NOITES de CIRCO
(Gycklarnas Afton, 1953)

Elenco: Åke Grönberg, Harriet Andersson, Anders Ek e Gunnar Björnstrand

Recebido pela mídia nos extremos, muito elogiado ou totalmente repudiado, foca no aspecto subjetivo do ser humano, narrando a peregrinação de um decadente circo, rumo a cidade natal do mestre de cerimônias. Com a intenção de reencontrar a esposa abandonada, ao chegar ao povoado, ele é assombrado por uma série de questões. A relação com a antiga mulher, a infidelidade da amante e as constantes humilhações sofridas guiam uma jornada ao seu âmago. Dosando com sobriedade e certo sadismo criativo, comédia e drama, traz à tona a questão da fidelidade e os conturbados meandros de relacionamentos a dois.

12
MONIKA e o DESEJO
(Sommaren med Monika, 1953)

Elenco: Harriet Andersson e Lars Ekborg

Primeira produção do diretor a ter sucesso comercial. Foi também o primeiro de muitos filmes em que Harriet Andersson iria fazer com ele. As suas cenas sofreram censura devido ao erotismo atrevido. É uma bela produção, apesar de passar longe dos anos de plenitude do realizador. Na trama, dois jovens se apaixonam e vivem um romance intenso de verão durante uma viagem de barco. Ela engravida e a narrativa acompanha a relação entre os dois após o idílio romântico.

13
VERGONHA
(Skammen, 1968)

Elenco: Liv Ullmann, Max von Sydow e Gunnar Björnstrand

Eva e Jan Rosenberg (Ullmann e Sydow) são músicos que moram numa ilha distante de tudo. Fala-se o tempo todo na possibilidade de uma invasão. E a vida tranquila desaparece quando as forças políticas nacionais passam a se enfrentar por perto. Alguns cidadãos são taxados de “colaboradores do inimigo” e há questionamentos, prisões, execuções e destruição. O abuso de poder e a guerra, contra a qual o diretor claramente se opõe, são duas das principais linhas do roteiro. As cenas na fazenda do casal são cheias de horror, de angústia, do mais profundo desespero.

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