_01.jpg) |
gene tierney
|
O MISTÉRIO de uma MULHER
Assisti LAURA diversas vezes, já não sei quantas foram. Sempre
me encanta. Um dos melhores títulos da vitoriosa carreira do diretor vienense
Otto Preminger e uma das histórias mais fascinantes do Cine Noir dos anos 1940.
Iniciado por Rouben Mamoulian, centra-se no mistério em torno da personagem
feminina do título, uma mulher que fascina muitos homens, desde o sentimento
necrófilo do tenente-detetive encarregado da investigação, até o sincero
entusiasmo amoroso de um sedutor gigolô de refinado porte, passando pela paixão
paranoica de um maduro e ciumento escritor. A trama se passa na cidade de Nova
York, onde a sofisticada Laura Hunt (Gene Tierney) foi assassinada.
O detetive Mark McPherson (Dana Andrews) assume o caso, e suas primeiras tarefas
são interrogar dois suspeitos, o jornalista Waldo Lydecker (extraordinário
Clifton Webb) e Shelby Carpenter (Vincent Price), o
noivo da falecida.

_05.jpg)
Preminger maneja o filme com leveza e elegância. Refinamento
na direção e tensão na construção do suspense. Um magnífico roteiro com
engenhosos diálogos e a esplêndida fotografia do grande Joseph LaShelle (que
levou seu único Oscar com este título) dotam o relato de um tom enigmático que
alcança sua máxima expressão com a aparição quase fantasmagórica da estrela
Gene Tierney, junto ao quadro que se destaca na sala onde transcorre boa parte
da ação. Perfeitamente dentro do thriller noir clássico, com as características
de ambientação urbana, definição da psique de personagens ambíguos e uma
perturbada trama, atmosfera taciturna, intervenção da femme fatale como eixo do
assunto e utilização da narrativa em flashback. LAURA é uma intensa película
romântica, com os ciúmes e a obsessão como principais mecanismos temáticos.
70 anos depois, tornou-se possivelmente um dos clássicos
mais adorados, mais queridos. É ao mesmo tempo um perfeito representante de seu
tempo e também um filme à frente de sua época. Tem um estilo clássico, mas
simultaneamente a narrativa tem ousadias, até a câmara faz suaves ousadias.
Toda a trama se desenvolve em um torno de uma jovem mulher estupendamente bela
– Laura. Porém, passam-se uns 30 preciosos minutos dos 88 de ação antes que ela
apareça. E quando Laura finalmente aparece, é num flashback, que é o relato do
personagem que mais tempo ocupa a tela e a narrativa, Waldo Lydecker, sujeito
insuportável, um dos tipos mais presunçosos, mais metidos a besta, mais
repulsivos que o cinema já mostrou, interpretado magistralmente por Clifton
Webb. Na época do filme, o ator tinha apenas 45 anos, mas parecia ter pelo
menos duas décadas e meia a mais, um contraste absurdo com a exuberante beleza
e juventude de Gene Tierney, que tinha apenas 24 anos quando fez o filme.
Preste atenção na sensível canção tema de David Raksin,
que depois ganharia letra de Johnny Mercer, virando um imenso sucesso, um
standard, uma pérola da grande música norte-americana, gravada por cantores e
cantoras importantes dos anos 1940 e 1950. O filme teve cinco indicações ao
Oscar: Melhor Direção, Melhor Roteiro, Melhor Ator Coadjuvante (Clifton Webb),
Melhor Direção de Arte em Preto-e-Branco e Melhor Fotografia em Preto-e-Branco.
Ganhou apenas o de Fotografia.
Nota: ***** (ótimo)
FICHA TÉCNICA
LAURA (Idem). Data: 1944. País: EUA. Duração: 88 min. P
& B. Produção e Direção: Otto Preminger (Twentieth Century-Fox). Roteiro:
Jay Dratler, Samuel Hoffenstein e Betty Reinhardt. Adaptação do romance de Vera
Caspary. Fotografia: Joseph LaShelle. Edição: Louis Loeffler. Música: David
Raksin. Cenografia: Lyle Wheeler e Leland Fuller (d. a.); Thomas Little e Paul
S. Fox (déc.). Vestuário: Bonnie Cashin
Elenco:
Gene Tierney (“Laura Hunt”), Dana Andrews (“Det. Lt. Mark McPherson”), Clifton
Webb (“Waldo Lydecker”), Vincent Price (“Shelby Carpenter”), Judith Anderson
(“Ann Treadwell”) , Dorothy Adams e
Grant Mitchell
O DIRETOR
OTTO PREMINGER
(1905 – 1986. Vyzhnytsya / Ucrânia)
Estudou Direito e Filosofia e trabalhou como diretor de
teatro antes de se dedicar ao cinema. Em 1935, optou por deixar a Áustria,
exilando-se nos Estados Unidos. Apesar da origem judia, atuou em alguns filmes
no papel de nazista, por causa do seu sotaque. Tinha fama de pessoa rude e
desagradável. Gostava de trabalhar com os temas dos desvios e conflitos comportamentais,
deixando grandes obras em diversos gêneros cinematográficos, do romance ao
filme de guerra. Seus principais filmes são “Laura” (1944); “Entre
o Amor e o Pecado / Forever Amber” (1947); “Alma em Pânico / Angel
Face” (1952); “Carmen Jones / Idem” (1954), musical
protagonizado por atores negros, que revelou Dorothy Dandridge e
Harry Belafonte; “O Homem do Braço de Ouro / The Man with the Golden
Arm” (1955), polêmico drama sobre drogas, que deu a Frank Sinatra seu
maior papel no cinema; “Bom Dia, Tristeza / Bonjour Tristesse” (1958), sensível drama baseado no best-seller de Françoise Sagan; “Anatomia
de um Crime / Anatomy of a Murder” (1959), cultuado drama de tribunal; “Exodus
/ Idem” (1960), épico sobre a formação de Israel após o final da Segunda
Guerra Mundial; “Tempestade sobre Washington / Advise & Consent” (1962), abordando a homossexualidade no universo político; “A Primeira
Vitória / In Harm's Way” (1965); e “Bunny Lake Desapareceu / Bunny
Lake Is Missing” (1965), um dos filmes símbolos dos anos 1960.
O ELENCO
GENE TIERNEY
(1920 – 1991. Nova Iorque / EUA)
Belíssima, nascida em uma família de posses, estudou nas
melhores escolas da costa leste dos Estados Unidos e da Suíça. Foi casada com o
estilista francês Oleg Cassini, com quem teve duas filhas. Iniciou a carreira
artística no teatro, em 1938. Seu primeiro filme, “A Volta de Frank James
/ The Return of Frank James”, em 1939, dirigida por Fritz Lang. Sendo os
mais importantes de sua carreira: “Caminho Áspero / Tobacco Road” (1941), de John Ford; “O Diabo Disse Não / Heaven Can Wait” (1943),
de Ernst Lubitsch; “Laura” (1944); “Amar Foi a Minha Ruína / Leave
Her to Heaven” (1945), de John M. Stahl; “O Fio da Navalha / The
Razor's Edge” (1946), com Tyrone Power e Anne Baxter; “O Fantasma
Apaixonado / The Ghost and Mrs. Muir” (1947), de Joseph L. Mankiewicz; “A
Ladra / Whirlpool” (1949), de Otto Preminger; “Passos na Noite / Night
and the City” (1950), de Jules Dassin; “Tempestade Sobre Washington” (1962), com Henry Fonda. Sua última atuação foi na minissérie televisiva “Scruples”,
em 1980. Em 1946 foi indicada ao Oscar da Academia de Artes e Ciências
Cinematográficas na categoria de Melhor Atriz pela atuação em “Amar Foi a
Minha Ruína”.
DANA ANDREWS
(1909 – 1992. Collins, Mississipi / EUA)
Em 1931, ele viajou até Los Angeles, Califórnia, buscando
oportunidades para trabalhar como cantor. Ali assumiu vários empregos e um dos
seus empregadores lhe pagou um curso na prestigiosa escola teatral Pasadena
Playhouse. Pouco depois assinaria contrato com o famoso produtor
cinematográfico Samuel Goldwyn e em 1940 estrearia em um filme de William
Wyler, “O Galante Aventureiro / The Westerner”, atuando ao lado de
Gary Cooper. Chamou a atenção como um jovem vítima de linchamento no faroeste
clássico “Consciências Mortas / The Ox-Bow Incident” (1943),
estrelado por Henry Fonda. Na sequência da carreira, assumiria papéis em filmes
noir. Em 1946, seria um soldado que retorna da guerra em “Os Melhores Anos
de Nossas Vidas / The Best Years of Our Lives”. Nos anos 1950, o
alcoolismo fez com que sua carreira declinasse. Em 1963, foi eleito presidente do Screen Actors Guild. Entre
1969 e 1972 ele apareceu como o presidente de faculdade Tom Boswell na novela
da NBC, “Bright Promise”.
CLIFTON WEBB
(1889 – 1966. Indianápolis, Indiana / EUA)
Começou como dançarino de salão, em Nova York, atuando
depois em musicais e dramas na Broadway e em Londres, além de filmes mudos. Seu
primeiro verdadeiro sucesso aconteceu na meia-idade como o elegante vilão Waldo
Lydecker em “Laura” (1944), seguido de Elliott Templeton em “O
Fio da Navalha” (1946) - ambos lhe valeram indicações ao Oscar. Seu famoso Mr. Belvedere, apresentado em filmes da Fox, foi
supostamente não muito longe de sua exigente, meticuloso e desgastante
persona da vida real. Ele era inseparável de sua mãe dominadora, Maybelle, com
quem viveu até a morte dela, aos 91 anos, seis anos antes de sua própria morte.
JUDITH ANDERSON
(1897 – 1992. Adelaide / Austrália)
No início dos anos de 1930, ela já se estabelecera como
uma das maiores atrizes do teatro de sua época e foi uma grande estrela na
Broadway em todas as décadas de 1930, 1940 e 1950. Em 1936, interpretou Gertrude
de “Hamlet”, com John Gielgud, em uma produção que também contou com
Lillian Gish como Ofélia. Em 1937, juntou-se à Old Vic Company em Londres e
interpretou Lady Macbeth, ao lado de Laurence Olivier. Em 1947, ela triunfou
como “Medeia”, ganhando o prêmio Tony de Melhor Atriz. Em Hollywood,
seus traços marcantes e não convencionalmente atraentes renderam-lhe
oportunidades limitadas e como coadjuvante. Ela, naturalmente, preferia o
palco. No entanto, fez um punhado de filmes importantes, sendo nomeada para
Melhor Atriz Coadjuvante por seu papel em “Rebecca, a Mulher Inesquecível
/ Rebecca” (1940), de Alfred Hitchcock (1940). Sua governanta Mrs. Danvers
é considerada um dos mais memoráveis e sexualmente ambíguos vilões do sexo
feminino. Seu trabalho no cinema continuou na década de 1950, quando também
participou de programas na televisão. Ela interpretou Herodias em “Salomé
/ Idem” (1953), Memnet em “Os Dez Mandamentos / The Ten Commandments” (1956), de Cecil B. de Mille, e teve um desempenho memorável como Big Momma no
filme da peça de Tennessee Williams, “Gata em Teto de Zinco Quente / Hot
Tin Roof” (1958). Apesar de dois casamentos, a atriz esteve sujeita a
especulações sobre sua sexualidade durante toda a sua carreira. Em sua
biografia de Otto Preminger: “The Man Who Would Be King” (2007),
Foster Hirsch afirma sem rodeios que Anderson era homossexual, estendendo-se
essa especulação até os dias atuais.
VINCENT PRICE
(1911 – 1993. St. Louis, Missouri / EUA)
Veio de uma família rica, em um ambiente
cultural acima dos padrões e envolta em tradições à moda europeia.
Começou no teatro, depois passou ao cinema onde ficou mundialmente conhecido
por contracenar em filmes de suspense e terror, o que lhe rendeu a alcunha de "Mestre
do Macabro". A sua trajetória é longa e inclui muitos clássicos. Seu
último filme foi “Edward Mãos de Tesoura / Edward Scissorhands” (1990).