agosto 31, 2015

................... 100 VEZES INGRID BERGMAN - I parte




TRIBUTO ao CENTENÁRIO da ATRIZ
(1915 - 2015)

INGRID BERGMAN, a anti-estrela. Alguns diretores e produtores definiam seu estilo como “glamour ao natural”, que fazia com que interpretasse da mesma maneira solar tanto uma monja como uma meretriz. A atriz faria sábado passado, dia 29 de agosto, 100 anos, e continua inesquecível, deixando um legado de extraordinárias interpretações em cerca de 50 filmes. De Estocolmo a Hollywood, de Rossellini a Ingmar Bergman, foi sempre segura e luminosa.

Retrato vivo de beleza, expoente máximo de feminilidade clássica, personagem de um dos romances mais icónicos da sétima arte. “Casablanca / Idem” (1942) e “Interlúdio / Notorious” (1946) são dois dos filmes que marcaram sua carreira. Ela nunca gostou muito do primeiro. “Fiz tantos outros filmes tão mais importantes, mas o único de que as pessoas querem sempre falar é aquele que fiz com Bogart”, queixou-se. Mas reconheceu sua importância: “Sinto que tem uma vida própria. Há nele qualquer coisa de místico.”.

gregory peck e ingrid
Do seu encontro com Humphrey Bogart no Marrocos de estúdio, ficou a miragem do “para sempre Paris”. A partir daí, INGRID BERGMAN superstar, figura lendária. Ela e o romantismo heroico de “Por Quem os Sinos Dobram For Whom the Bell Tolls”, o terror gótico de “À Meia-Luz / Gaslight” (1944), a ambiguidade e o beijo com Cary Grant de “Interlúdio”, a irreverência de “Quando Fala o Coração / Spellbound” (1945), o susto tresloucado de “Sob o Signo de Capricórnio / Under Capricorn” (1949), a estranheza de “Stromboli / Idem” (1950), o indizível de “Viagem à Itália / Viaggio in Italia” (1954), a dor de “O Medo / Non Credo più all'Amore - La Paura”, o humor refinado de “Indiscreta / Indiscreet” (1958) e “O Rolls-Royce Amarelo / The Yellow Rolls-Royce” (1964), a mágoa da “Sonata de Outono / Höstsonaten” (1978). Muitas vidas, muitas Ingrid.

Seu centenário foi homenageado no Festival de Cannes 2015 com o lançamento do sueco “Jag är Ingrid”, um documentário sobre sua vida, dirigido por Stig Björkman. Um retrato da atriz sueca, que morreu em 1982 de câncer de mama, estampou o cartaz oficial do festival.


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De santa à pecadora, a estrela sueca manteve seu brilho por cinco décadas.

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Talento reconhecido por público e críticos. Contemplada com três Oscars, dois de Melhor Atriz - “À Meia-Luz” e “Anastácia, a Princesa Esquecida / Anastasia” (1956) -, e um de Atriz Coadjuvante por “Assassinato no Expresso do Oriente / Murder on the Orient Express” (1974). Conquistou a sua primeira estatueta no papel de uma garota traumatizada por um assassinato que presenciou na infância e que acaba por casar com o perverso criminoso que tenta levá-la à loucura. Um drama clássico de George Cukor sobre aparências, fetiches, torturas, medos e obscuridade.

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A atriz foi disputada por grandes diretores. O mestre do suspense Alfred Hitchcock ficou fascinado por ela. Juntos, eles fizeram três filmes. Sua carreira inclui filmes dirigidos por Jean Renoir, Ingmar Bergman, Roberto Rossellini, George Cukor, Vincente Minnelli, Leo McCarey, Lewis Milestone. Atuava em comédias, suspenses, dramas.


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Nasceu em Estocolmo, capital da Suécia, em 29 de agosto de 1915.

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Aos 22 anos, apaixonada, casou-se com o jovem dentista Peter Lindström (1937 – 1950), do qual pouco se sabe, e com ele teve sua primeira filha, Pia. Foi casada também com Roberto Rossellini (1950 – 1957) e Lars Schmidt (1958 – 1975).

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Desde criança ela queria ser atriz. E famosa. Parecia um sonho impossível, já que a menina solitária, filha única que perdeu a mãe quando ainda tinha dois anos e o pai logo após completar doze, era extremamente tímida.


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Perseverante e metódica, INGRID BERGMAN iniciou na adolescência um diário que foi de grande ajuda para sua biografia, escrita em 1980 com Alan Burgess, “Ingrid Bergman - História de Uma Vida”.


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O pai, Justus Samuel Bergman, artista e fotógrafo, despertou na filha o gosto pelas artes, compartilhando o sonho de que ela seria uma estrela da ópera. Ela estudou canto por três anos, mas seu desejo era mesmo ser atriz, e encenava peças no estúdio de fotografia do pai.

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Cedo ganhou a independência que a iria acompanhar. Órfã, cuidou de si mesma, numa jornada de crescimento que se fez solitária: “Trabalhei, ganhei dinheiro e aos 18 anos era independente”.


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Na autobiografia, ela lembra a importância de ter sido aceita pela Escola Real de Arte Dramática de Estocolmo, em 1932, representando trechos de peças de Edmond Rostand e August Strindberg. A mesma na qual, anos antes, havia estudado Greta Garbo. “Tornei-me uma pessoa incrivelmente feliz, expansiva, porque estava fazendo exatamente o que queria. E era tão fácil pra mim”, confessou. Apesar da pouca idade, logo brilhou como atriz respeitada na Suécia, por seus trabalhos no teatro e pela formação escolar.

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Estreou no cinema aos 17 anos, com um pequeno papel em “Landskamp” (1932). Na época, fez “Valborgsmässoafton”, lançado no Brasil como “O Grande Pecado” (1935). O grande impulso da carreira da atriz veio com o a parceria com o diretor Gustaf Molander, um dos mais importantes nomes do cinema sueco, que marcou particularmente na década de trinta. Fizeram filmes como “Swedenhielms” (1935), “Pa Solsidan” (1936) e “Intermezzo” (1936).

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A jovem estrela quis muito fazer o filme “A Mulher que Vendeu a Alma / En kvinnas Ansikte” (1938), cujo título se tornou mais famoso na versão posterior de Cukor com Joan Crawford, “Um Rosto de Mulher / A Woman’s Face” (1941). Novamente dirigida por Molander, interpreta uma desfigurada num acidente que lhe deforma também o caráter, tornando-a uma odiosa chantagista. De final ambíguo. É um dos mais sugestivos papéis de INGRID BERGMAN do seu período sueco nos anos trinta.

com spencer tracy 
em o médico e o monstro
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Interpretou com garra a parceira de um violinista casado em “Intermezzo”. Adultério e música clássica configuravam uma combinação rara, um sucesso, e a realização de Molander chegou a Nova York em 1938. O produtor David O. Selznick (de “... E o Vento Levou / Gone swith the Wind”, 1939) se interessou pela história e por aquela atriz diferente. A versão norte-americana de “Intermezzo: Uma História de Amor / Intermezzo – A Love Story” (1939) foi seu primeiro filme em Hollywood. Sob a direção de Gregory Ratoff e ao lado de Leslie Howard, teve êxito estrondoso. Diante da possibilidade da Segunda Guerra, ela assinou um contrato de exclusividade por sete anos com Selznick.

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“De repente, ele [Selznick] ficou muito quieto. Olhou profundamente para mim e disse: ‘Tive uma ideia, tão simples que nunca antes em Hollywood alguém a tentou aplicar. Não vamos tocar nada em você. Nada vai ser alterado. Vai continuar a ser você mesma. Você vai ser a primeira atriz ‘natural’”, contou INGRID BERGMAN.



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Com “O Médico e o Monstro / Dr. Jekyll and Mr. Hyde” (1941), baseado no clássico de Robert Louis Stevenson, ela festejou nos EUA outro sucesso. Ao lado de Spencer Tracy, seduz no papel de Ivy Peterson, que foi assassinada pelo obsessivo Mr. Hyde. Grande composição dessa personagem ambígua, misto de prostituta e santa. A atriz trocou, à última hora, o seu papel com o de Lana Turner, a quem deixou a personagem “boazinha”. A dela é a mesma de Miriam Hopkins no precedente de Rouben Mamoulian.

paul henreid, ingrid e humprhrey bogart, 
o triangulo amoroso
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Na época, era a segunda sueca a dar certo em Hollywood. Mas ao contrário de Greta Garbo que resolveu ficar sozinha em 1941, INGRID BERGMAN ascendia em popularidade, conquistando público e crítica com suas personagens sensuais e divididas, frágeis e desamparadas.

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Talvez a sua performance mais aclamada tenha sido o de Ilsa Lund – a mulher entre o amor de dois homens, em “Casablanca”, onde contracenou com Humphrey Bogart. O filme ‘pega fogo’ quando INGRID BERGMAN entra no Rick’s Bar e Sam para de tocar e olha para ela. Nunca o olhar de Ingrid foi tão desarmado, tão quente, tão úmido como quando pediu que ele tocasse o “As Time Goes By”. Nunca o olhar de Bogart foi tão cerrado, tão frio, tão seco, como quando, ouvindo a música e não vendo a amada, disse: “Sam, I thought I told you never to play…’ A canção, composta por Herman Hepfeld, transformou-se na música-símbolo do romantismo cinematográfico de todos os tempos.

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“Casablanca” exerce no público um fascínio há mais de 70 anos. Trata-se de um cult movie, na melhor tradução do termo. O diretor Michael Curtiz conseguiu parte do clima de tensão e mistério fazendo com que os próprios atores ignorassem o final, até o momento de rodar a última cena. Cinema do mais alto nível, com romance, intriga, suspense e um elenco dos melhores que Hollywood já reuniu em um filme. Vencedor dos Oscar de Melhor Filme, Melhor Roteiro Adaptado e Melhor Direção.




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Durante as filmagens de “Casablanca”, Bogart precisava usar saltos de 7,6 cm nos sapatos para disfarçar o fato de que era mais baixo que INGRID BERGMAN. Longe das câmeras, o ciúme da terceira esposa do ator, Mayo Methot, o impedia de se aproximar demais da parceira de filme. Mais tarde, ela declarou: “Eu o beijei, mas nunca o conheci”. Assim que o casamento do Bogart acabou, dizem alguns que o principal motivo foi Ingrid.

com cary grant em interlúdio
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No início dos anos 1940, ela se popularizou rapidamente como uma das maiores estrelas do cinema mundial. Vários sucessos ao lado de celebridades como Gary Cooper, Charles Boyer, Humphrey Bogart, Spencer Tracy, Gregory Peck, Cary Grant, Bing Crosby, Charles Laughton. Ela conquistou o coração do público.

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Em 1945, começou uma parceira importante com Alfred Hitchcock. Seu prestígio só fez aumentar. “Quando Fala o Coração” abriu a sequência que teria o brilhante “Interlúdio” (1946) e seria encerrada com “Sob o Signo de Capricórnio” (1949). Hitchcock era “um adorável" gênio nas palavras da atriz, que fez uma emotiva homenagem a ele em 1979, quando apresentou o prêmio pela carreira do diretor concedido pela American Film Institute.

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Alfred Hitchcock afirmava que 95% do sucesso de um filme se devia ao diretor e que os atores “deviam ser tratados como gado”. Ingrid Bergman se sentia frustrada com essa teoria perversa. Nos sets de “Quando Fala o Coração”, ela pediu para discutir o personagem e ele disse: “Está no roteiro”. A atriz perguntou: “Mas qual é a minha motivação?”. “O seu salário!”. Em outra ocasião, ela insistiu: “Eu não me sinto como a personagem”. “Então simplesmente finja”, rebateu o cineasta.

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Para muitos, trata-se da obra-prima absoluta de Hitchcock, uma soberba história de amor com uma intriga de espionagem por pano de fundo. “Interlúdio” é o filme do voluptuoso beijo entre Ingrid e Cary Grant, num movimento de câmara tantas vezes imitado.

ingrid e hitchcock
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Hitchcock tentou trazer INGRID BERGMAN para o papel de Maddalena Anna Paradine em “Agonia do Amor / The Paradine Case” (1947), mas a atriz não queria voltar a trabalhar com Selznick depois das tumultuadas gravações de “Interlúdio”, por conta das interferências dele no processo criativo dos filmes. O produtor então contratou Alida Valli, considerada na época uma das mais promissoras atrizes italianas.

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Numa noite de 1948, ela e seu marido Peter entraram num pequeno cinema de Hollywood e assistiram a “Roma, Cidade Aberta / Roma Città Aperta” (1945). Ao término da projeção, ela estava emocionada. Talvez fosse a resposta à sua insatisfação. Mas nem de longe poderia imaginar que aquele filme de Roberto Rosselini, carro-chefe do movimento neo-realista italiano, seria o ponto inicial de uma dramática mudança em sua vida.

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Intrigada, enviou ao diretor italiano uma carta que entraria para a história. “Vi seus filmes Roma, Cidade Aberta e Paisà, e fiquei encantada. Se precisar de uma atriz sueca que fale bem inglês, que não esqueceu o alemão, que não é muito compreensível em francês e que em italiano só saber dizer 'Ti amo', estou na lista para fazer um filme com o senhor”.

ingrid e rossellini
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Durante as filmagens de “Stromboli” passou a viver com Roberto Rossellini, abandonando o marido, Peter Aron Lindstrom, com quem havia casado ainda na Suécia. O escândalo foi agravado quando teve um filho com o cineasta, antes de se casarem, o que a afastou do cinema norte-americano. O casamento com Rossellini rendeu seis filmes e mais as gêmeas Ingrid e Isabella.

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Em 1946, ela protagonizou a peça “Joan of Lorraine”, de Maxwell Anderson, com triunfo, sendo a origem do épico rodado em 1948. Entretanto, a peça mostra como os atores de uma montagem de Joana D’Arc têm suas vidas mudadas pelos personagens que interpretam. Para os padrões de Hollywood, foi necessária uma história mais convencional, e sobrou apenas a trajetória da mártir no roteiro. Ela batalhou para fazer o filme, juntando-se ao marido, ao diretor Victor Fleming e ao produtor Walter Wanger para criar a Sierra Pictures – cujo primeiro e único projeto foi este épico sem identidade.

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Houve muitos recursos (cinco milhões de dólares, quatro mil extras) e cuidados com a autenticidade; mas o resultado não correspondeu à expectativa. “Joana d’Arc / Joan of Arc” tem sequências deslumbrantes em Technicolor (Oscar para a fotografia de Joseph Valentine, Winton C. Hoch e William V. Skall), porém, sem substância. A encenação é medíocre, substituindo o sublime pelo pitoresco. Por ocasião da estreia, o comentarista do Los Angeles Daily News escreveu: “A direção de Fleming é quase insensata”. Do desastre, salvam-se os desempenhos esforçados de INGRID BERGMAN e José Ferrer, este marcando sua estreia diante das câmeras como o indeciso Delfim. Ambos concorreram ao Oscar.


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No auge do escândalo Bergman / Rossellini, “Joana D’Arc” foi editado para uma versão de apenas 100 minutos, perdendo muito de suas características. Apenas em 1998 uma restauração foi feita e a versão completa de 145 minutos ressurgiu.

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Voltaria a interpretar Joana D’Arc em 1954, dirigida pelo marido Rossellini.

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O motivo maior do escândalo foi a gravidez anunciada, fruto de seu adultério. Afinal, o público ainda a tinha na memória como a freira de “Os Sinos de Santa Maria / The Bells of St. Mary's” (1945) ou a mística guerreira “Joana D’Arc”. Ao dar à luz a Robertino em 1950, sem o divórcio de Peter ter sido concedido, a “pecadora” já estava banida de Hollywood.


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Joseph L. Mankiewicz pode ser definido como um diretor talentoso e um roteirista e produtor de mão-cheia. Assim chegou a dirigir 20 filmes para a Metro-Goldwyn-Mayer e 20th Century-Fox, duas gigantes da indústria cinematográfica norte-americana. Visionário, supervisionou de perto “A Malvada / All About Eve” (1950), baseado em um caso verídico publicado na revista Cosmopolitan, em 1940. Cuidou do roteiro, da direção e da escolha do cast. O elenco principal e definitivo, que viria a ajudar o filme a ser um clássico, não era a primeira opção do diretor, que chegou a cogitar nomes como Marlene Dietrich, Claudette Colbert, INGRID BERGMAN, Ronald Reagan e Zsa Zsa Gabor.

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Fixada na Europa, fez vários filmes com Rossellini. Com seu talento natural, ela não teve dificuldades em personificar dramas realistas e poéticos como “Viagem à Itália”, um dos melhores do diretor. A crise de um casal numa viagem, a perda e a reconquista da fé. O filme que, como escreveu Jacques Rivette na sua célebre “Lettre sur Rossellini”, abriu “uma brecha por onde todo o cinema moderno deve obrigatoriamente passar”.

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O primeiro longa dela com Rossellini marcou uma viragem importante no percurso do realizador e no da atriz. À época, Eric Rohmer comentou: “Stromboli, grande filme cristão, é a história de uma pecadora tocada pela graça”. Por muitas razões, uma das mais extraordinárias experiências cinematográficas. De uma beleza alucinante, é um filme-poema. Mas Rossellini, sufocante, não a deixava trabalhar com outros diretores. Foi obrigada a recusar a infiel Condessa Lívia Serpieri de “Sedução da Carne / Senso” (1954), de Luchino Visconti. Só Jean Renoir conseguiu vencer essa barreira quase intransponível, fazendo com que se mostrasse radiante em “As Estranhas Coisas de Paris / Elena et les Hommes” (1956), liderando o elenco com Jean Marais e Mel Ferrer.

com mel ferrer em as estranhas coisas de paris
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“As Estranhas Coisas de Paris” é uma comédia de amor e poder que tem como fundo histórico a Belle Époque. Foi realizado em duas versões, a francesa e a inglesa, sendo a primeira considerada por Renoir como a versão de referência. “O filme é sobre outra coisa – sobre o erotismo raro de INGRID BERGMAN, e o modo como o seu rosto parece ter uma luz interior em cinema. Terá havido atriz mais sensual no cinema? Numa crítica ao filme, François Truffaut observou que ‘o sexo é o único foco de atenção’”, escreveu Roger Ebert.

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No mesmo ano, com o casamento em crise, voltou ao cinema norte-americano pelas mãos do veterano Anatole Litvak, diretor de “A Cova das Serpentes / The Snake Pit” (1948). Filmado na Inglaterra, “Anastácia, a Princesa Esquecida” rendeu a Ingrid os prêmios de Melhor Atriz do Oscar e do Círculo dos Críticos de Cinema de Nova York. Ao recebê-los, só encontrou festas e aplausos. A América pedia perdão pelo desprezo de outrora. A estreia de gala foi em Los Angeles, para aclamação geral, “[Ingrid Bergman é] nada menos do que esplêndida”, opinou o The New York Times. “Foi esta Anastásia indomável e por fim triunfante, tão parecida à própria INGRID BERGMAN, que o público e a crítica reconheceram quando voltaram a apaixonar-se por ela no fim de 1956”, disse o biógrafo e historiador Donald Spoto.

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O filme propiciou não só esse doce retorno e o Oscar, mas também intensificou sua carreira. Sem a tutela repressiva de Rossellini ou de Selznick, e já casada com o empresário sueco Lars Schmidt, ela podia escolher roteiros e diretores.


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Ao apresentar o prêmio de Melhor Filme na cerimônia do Oscar em 1959, muito aplaudida ao subir ao palco para anunciar o vencedor da categoria principal, brincou: “Passei de santa a puta e depois a santa de novo, tudo isso em uma única vida”.

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Foi a primeira escolha para o papel de Terry McKay em “Tarde Demais para Esquecer / An Affair to Remember” (1957), de Leo McCarey. O melodrama dos melodramas. Um clássico imbatível. Vivendo na Europa, ela recusou viajar para os EUA.

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O papel da irmã Luke em “Uma Cruz à Beira do Abismo / The Nun’s Story” (1959) também lhe foi oferecido, mas ela se considerou velha para desempenhá-lo, sugerindo o nome de Audrey Hepburn.


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INGRID BERGMAN, Jeanne Moreau e Elsa Martinelli rejeitaram a Varínia do épico “Spartacus / Idem” (1960). Jean Simmons foi escolhida pelo próprio Stanley Kubrick, apesar da pronúncia britânica da atriz (que os produtores queriam ser exclusiva dos intérpretes de personagens romanos).

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Ter recusado o papel de Zira em “O Planeta dos Macacos / Planet of the Apes” (1968), deixando de atuar com Charlton Heston, foi uma decisão que lamentou, como mais tarde confidenciou à filha, Isabella Rossellini.

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Surpresa por ter vencido o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante por “Assassinato no Expresso do Oriente”, a bela e modesta estrela homenageou outra indicada ao prêmio que também estava ótima: a italiana Valentina Cortese em “A Noite Americana / La Nuit Américaine” (1973). Segundo o diretor Sidney Lumet, “Ela tinha escolhido um pequeno papel e não consegui fazê-la mudar de ideia. Era docemente teimosa. Mas muito teimosa… como o papel era tão pequeno, decidi filmá-la numa grande cena, em que fala quase durante cinco minutos, sem corte. Muitas atrizes teriam hesitado em fazê-lo. Ingrid adorou e tirou o maior partido. Percorreu todo o espectro emocional. Nunca vi uma coisa assim”.


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Durante as filmagens com seu compatriota Ingmar Bergman, em 1977, detectou os primeiros sinais do câncer que a mataria. Mas enfrentou a doença com bravura.

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Recebeu seis indicações ao Oscar da Academia para Melhor Atriz, por suas atuações em “Por Quem os Sinos Dobram” (1943), “À Meia Luz” (1944), “Os Sinos de Santa Maria” (1945), “Joana D'Arc” (1948), “Anastacia, a Princesa Esquecida” (1956) e “Sonata de Outono” (1978). Venceu em 1944 e 1956.

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Continuaria a sua carreira até 1982, época em que encerra o ciclo profissional com um prêmio Emmy e a sua jornada pessoal de vida, aos 67 anos, com a derrota contra o câncer mamário com o qual lutou durante oito anos.


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“Não tenho arrependimentos. Não teria vivido a minha vida da forma que vivi se me preocupasse com aquilo que as pessoas iriam pensar”. Era assim INGRID BERGMAN, a beldade sueca que tomou as rédeas da sua própria vida. E tal como Rick Blaine de Casablanca terá sempre Paris, nós sempre teremos sua beleza e talento.

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Na década de 1970 apareceu raramente diante das câmeras. Ainda fez aparições memoráveis em “Questão de Tempo / A Matter of Time” (1976) e “Sonata de Outono”, no qual vivencia um angustiante reencontro entre mãe e filha, ao lado de Liv Ullmann. Composto como uma sonata, rodado na Noruega, marca o encontro de dois nomes importantes do cinema sueco, os dois Bergman, com ela no seu último papel em cinema.

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Faleceu em 1982, no dia de seu 67° aniversário, em Londres. “Ela mostrou que as mulheres são independentes, que as mulheres querem contar a sua própria história, querem tomar a iniciativa, mas às vezes elas não podem, porque às vezes a nossa cultura social não permite que as mulheres rompam com certas regras”, disse sua filha Isabella.


agosto 18, 2015

*************** ALAIN DELON, o ÍCONE da BELEZA



Herói das sagas de Visconti e de filmes de ação, tornou-se famoso por causa da sua beleza de tirar o fôlego. Foi considerado por duas décadas como “o homem mais belo do mundo”. Isto nunca o agradou, mas mesmo trabalhando com renomados diretores continuou sendo visto pelo público como apenas um rosto bonito. Toneladas de tinta foram derramadas na análise das características profissionais e pessoais do charmoso ALAIN DELON (Sceaux, França, 1935), um dos mitos do cinema europeu, comparado ao ator Gérard Philipe. Protagonizou cerca de 80 filmes, ficando marcado como a estampa ideal para personagens solitários, sombrios, frios, violentos, que tem algo a esconder ou estão remoídos pela revolta e vingança.

Sua vida daria um filme emocionante. Quando fez quatro anos seus pais se divorciaram, passando a ser criado por um casal que morava perto de uma prisão, onde ele brincava com os guardas. Esses pais adotivos foram misteriosamente assassinados e ele voltou a conviver com sua genitora, então casada com outro homem. Teve uma infância problemática, inclusive sendo expulso de várias escolas. Aos 15 anos parou de estudar e, aos 17, alistou-se na marinha e depois se tornou paraquedista dos fuzileiros navais na Guerra da Indochina. Em 1956, morando em Paris, sem dinheiro, trabalhou como porteiro, garçom, secretário e açougueiro. 


Em 1957, foi ao Festival de Cannes com o ator gay Jean-Claude Brialy, chamando a atenção por sua formosura. O mítico produtor norte-americano David O. Selznick (que levou Louis Jourdan para Hollywood no final dos anos 1940) lhe ofereceu um contrato de sete anos, desde que aprendesse a falar inglês. Retornando a Paris para estudar o idioma de Tio Sam, conheceu o cineasta Yves Allégret, que o convenceu a começar a carreira no seu próprio país. Com ele estreou num pequeno papel em “Uma Tal Condessa / Quand la Femme s'en Mele” (1957).
 
alain e romy schneider
No romântico “Christine / Idem” (1958) contracenou com a austríaca Romy Schneider, três anos mais nova, e eles se apaixonaram. Juntos formavam o casal ideal: beleza, juventude e fama. O romance tempestuoso, marcado pela infidelidade bissexual do jovem ator, durou cinco anos, ajudando a desequilibrar a personalidade instável da atriz. A relação findou por causa de outra mulher, Nathalie. Ao voltar dos EUA, Romy encontrou um bilhete com uma frase que a torturou pelo resto de sua vida: “Vou para o México com Nathalie”

Ela nunca superou o golpe, não só por ter perdido o seu grande amor, mas pelo trauma de ser abandonada mais uma vez, como havia acontecido na infância com o pai. Em 1977, cinco anos antes de morrer, confessou que ALAIN DELON foi o homem mais importante de sua vida. O ator também declarou que Romy foi o maior amor de sua vida. Ainda vivendo com ela interpretou seu primeiro grande papel: o Tom Ripley do clássico de suspense “O Sol por Testemunha”, de René Clément. Pele bronzeada, olhos azuis faiscando sob o cabelo revolto, causou frisson, numa aparição mortalmente atraente. O mundo inteiro exclamou: “Como ele é sexy!”. Na época, nos bastidores, muito se falou sobre o seu caso com Clément, então com 47 anos, que o dirigiria outras vezes em “Que Alegria de Viver / Che Gioia Vivere” (1961), “Jaula Amorosa / Les Félins” (1964) e “Paris Está em Chamas? / Paris Brûle-t-il?” (1966).
 
com renato salvatori 
em rocco e seus irmãos
Sob o comando de Luchino Visconti, atuou em “Rocco e seus Irmãos”, um drama elogiado. Ator e diretor se tornaram amantes, trabalhando juntos em outro clássico, “O Leopardo”, vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes. Rodou com Monica Vitti “O Eclipse”, último filme da célebre “Trilogia da Incomunicabilidade” de Michelangelo Antonioni. Sua parceria com Jean-Pierre Melville também foi extraordinária, gerando longas inesquecíveis como “O Samurai - o matador de aluguel profissional Jef Costello é um dos seus papéis mais famosos -, “O Círculo Vermelho” e “Expresso para Bourdeaux / Un Flic” (1972). Trabalhou com outros notáveis cineastas: Alain Cavalier, Louis Malle, Julien Duvivier, Valerio Zurlini, Joseph Losey, Jean-Luc Godard, Völker Schlöndorf, Bertrand Blier, Patrice Leconte.
 
nathalie e alain
Lançou sua carreira em Hollywood, mas os resultados ficaram longe do desejável. “O Rolls-Royce Amarelo / The Yellow Rolls Royce (1964), “A Marca de Um Erro / Once a Thief” (1965) e “A Patrulha da Esperança / Lost Command” (1966) foram fracassos de bilheteira e crítica. Em 1964, casou-se com Nathalie, separando-se dela em 1969 após um badalado escândalo. Um dos seus guarda-costas, o belo iugoslavo Stevan Markovic, apareceu morto a tiros, e as investigações revelaram um triângulo sexual. Por alguma razão, ele foi assassinado depois de uma noitada de álcool, drogas e sexo. Em casa só estavam os três. A seguir, envolveu-se em orgias bissexuais e teve ligações com o gangster corso François Marcantoni. Ainda assim, nada parecia abalar sua reputação. Nos anos seguintes, teve um longo relacionamento com outra atriz, Mireille Darc.


Na década de 1970, a carreira de ALAIN DELON deu uma reviravolta. Ele optou por filmes comerciais, de ação, geralmente também como produtor, e em três deles como diretor. Em 1973, sua ex-amante, a cantora Dalida, convidou-o para fazer um dueto com ela na canção “Paroles, Paroles”, revelando-se um enorme sucesso. Em 1987 conheceu a modelo holandesa Rosalie Van Bremen, 32 anos mais nova que ele, iniciando outro casamento. O divórcio aconteceu em 2001. Essa separação foi difícil para ele, convivendo com períodos de depressão e pensando em suicídio. Ganhou o prêmio César de Melhor Ator por “Quartos Separados / Notre Histoire” (1984) e o Urso de Ouro Honorário, no Festival de Berlim, em 1995. Mesmo anunciando o fim de sua carreira em 1998, retornou em “Asterix nos Jogos Olímpicos / Astérix aux Jeux Olympiques” (2008). Pouco antes, atuou em minisséries televisivas, dirigindo também com competência a empresa Alain Delon Diffusion, que imprime até hoje o seu nome em relógios, roupas, óculos, champanhe, conhaque, papelaria, cigarros.
 
Durante muito tempo ALAIN DELON foi o astro francês mais rentável, tendo atraído às salas de cinema mais de 100 milhões de espectadores. A imprensa estrangeira costumava lhe chamar de “Brigitte Bardot masculino”, pelo físico atraente e sucesso internacional. Há cerca de dez anos, a autobiografia do ator Helmut Berger e uma biografia não autorizada, do jornalista Bernard Violet, revelaram sua bissexualidade. Berger lembrou o caso do ator com Luchino Visconti, na época de “Rocco e seus Irmãos”, e Violet foi ainda mais longe, contando detalhes sobre suas aventuras amorosas com figuras de ambos os sexos e envolvimento com mafiosos e políticos de reputação duvidosa, além de problemas com álcool e drogas. Aos 80 anos, Cavaleiro da Legião de Honra Francesa, ele ainda atua. Sem dúvida é uma das maiores estrelas europeias de todos os tempos.

com claudia cardinale em o leopardo

10 FILMES de ALAIN DELON
(por ordem de preferência)

01
ROCCO e seus IRMÃOS
(Rocco e i Suoi Fratelli, 1960)
direção de Luchino Visconti
elenco: Renato Salvatori, Annie Girardot,
Katina Paxinou e Claudia Cardinale

02
O LEOPARDO
(Il Gattopardo, 1963)
direção de Luchino Visconti
elenco: Burt Lancaster, Claudia Cardinale e Pierre Clémenti

03
O CÍRCULO VERMELHO
(Le Cercle Rouge, 1970)
direção de Jean-Pierre Melville
elenco: Gian-Maria Volonté, Yves Montand e François Périer

04
A PRIMEIRA NOITE de TRANQUILIDADE
(La Prima Notte di Quiete, 1972)
direção de Valerio Zurlini
elenco: Lea Massari, Giancarlo Giannini,
Renato Salvatori e Alida Valli

05
O SAMURAI
(Le Samouraï, 1967)
direção de Jean-Pierre Melville
com François Périer e Nathalie Delon

06
O SOL por TESTEMUNHA
(Plein Soleil, 1960)
direção de René Clément
elenco: Maurice Ronet e Marie Laforêt

07
O ECLIPSE
(L’Eclisse, 1962)
direção de Michelangelo Antonioni
  elenco: Monica Vitti e Francisco Rabal

08
CIDADÃO KLEIN
(Mr. Klein, 1976)
direção de Joseph Losey
elenco: Jeanne Moreau, Suzanne Flon e Massimo Girotti

09
GANGSTERS de CASACA
(Mélodie en Sous-sol, 1963)
direção de Henri Verneuil
elenco: Jean Gabin e Viviane Romance

10
A PISCINA
(La Piscine, 1969)
direção de Jacques Deray
elenco: Romy Schneider, Maurice Ronet e Jane Birkin

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